sábado, 3 de maio de 2008

Simbologia

1. Símbolos religiosos

  • Gomes Freire => Cristo:
    -» o general morre às mãos de um poder político opressivo que se sente ameaçado, de um poder militar estrangeiro (Beresford <-> Pôncio Pilatos) e de um poder religioso reaccionário (principal Sousa <-> fariseus);
    -» ambos são sujeitos a um julgamento fictício e condenados por razões do Estado;
    -» ambos sofrem uma morte indigna: Cristo é cruxificado, castigo próprio dos ladrões; Gomes Freire é enforcado (a morte adequada a um militar era o fuzilamento) e não tem direito a uma sepultura (o corpo é queimado e os restos atirados ao mar - p. 135).

  • Principal Sousa => Judas:
    "... vende Cristo todos os dias, a todas as horas, para o conservar num poder que Ele nunca quis..." (p. 123);
    -» Matilde acusa-o de ser pior do que Judas, porque nem sequer se arrepende: "Judas, que traiu Cristo uma vez, acabou enforcado numa figueira, mas Vossa Reverência, que O trai todos dias, vai acabar entre os seus com todas as honras que neste Reino se concedem a hipócritas e se negam aos justos..." (pp. 128 e 129);
    -» o gesto de desprezo de Matilde (atira-lhe a moeda aos pés) simboliza o pagamento da traição, ou seja, os 30 dinheiros que Judas recebeu por denunciar Cristo.

  • A prisão de Gomes Freire com mais 12 homens:
    -» Jesus Cristo (Gomes Freire) e os 12 apóstolos, excluindo Judas (p. 112);
    -» o n.º 12 representa o ciclo completo (por exemplo, os doze meses do ano);
    -» o n.º 13, que se segue ao 12 (La Palisse), representa a ideia de renovação, isto é, completo um ciclo, tudo se renova e novo ciclo se iniciará. No fundo, estamos perante a esperança de que os treze prisioneiros, a sua prisão e condenação, sirvam como ponto de partida para uma mudança na situação de Portugal.
2. Símbolos cromáticos

  • Verde:
    »» associado à saia de Matilde, oferta de Gomes Freire, representa o amor e a afectividade entre ambos;
    »» tratando-se de uma saia que ela nunca usou, pode querer dizer que o amor de ambos, até ao momento, ainda não foi posto à prova;
    »» a esperança: primeiro, de Matilde, que espera que o companheiro seja libertado; posteriormente, de que a morte do generalnseja a sementa da revolta e da libertação.

  • Vermelho: é o símbolo do princípio fundamental da vida, mas, sendo, paralelamente, a cor do sangue e do fogo, representa a vida e a morte. Representa ainda o sagrado e o secreto, daí que principal Sousa se vista de vermelho. Sendo a cor do fogo, partilha com o sol a capacidade de dar vida e de destruir.

  • Preto:
    * é a cor do desespero e do luto antecipado de Matilde pela morte do general (ela aparece sempre em palco vestida de negro);
    * já o luto de Sousa falcão é por si mesmo, não pelo general, pois não foi capaz de manter as suas convicções e morrer, juntamente com Gomes Freire, em defesa das mesmas ("É por mim que estou de luto, Matilde! Por mim..." - p. 137).
3. Outros símbolos

  • Lua:
    > simboliza a noite, a infelicidade, o mal, o sofrimento, a morte e o castigo;
    > para Manuel, simboliza uma esperança de uma claridade que teima em fugir-lhe (p. 78);
    > para D. Miguel, o luar é um adjuvante, pois permite ver as fogueiras em que ardem os condenados, ou seja, permite visualizar o horror e instalar o medo entre os populares que assistem;
    > representa o tempo que passa e a passagem da vida à morte e da morte à vida (todos os meses, a lua «morre» três dias). É esta noção de renascimento que Matilde encontra na lua: ela permite ver o fim de um ciclo, o fim da noite, das trevas. O seu homem está a morrer, mas essa morte é somente a passagem para um outro estádio da existência (p. 140).


  • Luz:
    > está ligada à fogueira e ao fogo, elemento destruidor e purificador, bem como ao luar e à noite;
    > é a metáfora do conhecimento que permite o progresso, o futuro, logo a neutralização da noite, entendida como símbolo da falta de liberdade, do poder absoluto e opressivo, da injustiça, da ausência de esclarecimento;
    > assim sendo, a luz remete para os valores do futuro: a LIBERDADE, a IGUALDADE, a JUSTIÇA e a FRATERNIDADE;
    > a luz da fogueira, se, por um lado, destrói o corpo de Gomes Freire, por outro, permite que o seu exemplo de coragem, de determinação, de liberdade seja visto por todos que assistem à execução, permitindo que o Bem acabe por triunfar.


  • Fogueira:
    -> simboliza a purificação, a morte da velha ordem, um novo mundo;
    -> por outro lado, na boca do Antigo Soldado e de Manuel, simboliza a opressão e o terror (pp. 80, 109), ideia comungada por D. Miguel Forjaz: "Lisboa há-de cheirar toda a noite a carne assada, Excelência, e o cheiro há-de-lhes ficar na memória durante anos... Sempre que pensarem em discutir as nossas ordens, lembrar-se-ão do cheiro..." (p. 131);
    -> para Matilde, a fogueira possibiltará a tomada de consciência da repressão e transformar-se-á em fonte de revolta e mudança. Assim, Gomes Freire, qual fénix, renascerá das cinzas e será uma lição para o mundo.


  • Título:
    -> tratando-se de uma frase exclamativa, remete para a possibilidade de a frase ter sido pronunciada por alguém;
    -> de facto, esta frase é, primeiro, pronunciada por D. Miguel Forjaz (p. 131) e pretende funcionar como um aviso a todos aqueles que ousem desafiar a ordem estabelecida, portanto como um elemento amedrontador e aterrorizador;
    -> a segunda personagem a proferi-la é Matilde e, neste caso, a frase traduz a esperança que o povo continue a lutar contra a tirania e a injustiça, a partir do exemplo de crueldade (dos governadores) e, em simutâneo, de ousadia e coragem (do general) a que está assistir.


  • Saia verde de Matilde:
    -> associa-se, pela cor, à renovação anual da Natureza e à cor da esperança;
    -> representa a esperança do reencontro depois da morte ou a crença em que aquele amor é imortal;
    -> simboliza a regeneração e o renascimento: "Matilde - Foi para o receber que eu vesti a minha saia verde!" (p. 137);
    -> simboliza o despertar da vida (p. 114);
    -> simboliza, no fundo, a própria VIDA: "Matilde - Olha, meu amor, vesti a saia verde que me compraste em Paris!" (p. 138).


  • Tambores: simbolizam a opressão / a repressão; provocam medo nos pulares que, mal ouvem o seu som, se põem em fuga (pp. 18 e 139): "Símbolo de uma autoridade sempre presente e sempre pronta a interferir".