segunda-feira, 17 de março de 2008

7. Título

O vocábulo «lusíadas» foi criado por André de Resende e deriva do termo «Luso», personagem apresentada como filho ou simples companheiro de Baco.
Luso foi considerado o povoador e primeiro rei-pastor da última Tule, à qual teria dado o nome de Lusitânia e o de Lusos ou Lusitanos aos respectivos habitantes.
André de Resende, seguindo o exemplo de Virgílio, que criou o nome da sua epopeia - Eneida (< AEneades) - a partir de AEneas (Eneias), criou então o vocábulo «lusíadas». Camões, reconhecendo nele grande carga épica, adoptou-o como título da sua epopeia.

6. Características da epopeia

A epopeia clássica apresenta um conjunto de características próprias, concretamente as seguintes:
1. Acção: conjunto de acontecimentos relativos ao desenvolvimento do tema.
1.1. Qualidades da acção:

. Unidade:
as diferentes partes devem ligar-se de maneira a que formem um todo harmonioso.

. Integridade:
as relações que ligam os acontecimentos devem criar uma intriga com princípio, meio e fim.

. Variedade:
consiste na introdução de pequenas narrativas - os chamados episódios - que embelezam a acção e quebram a sua monotonia.

. Verdade:
o assunto da epopeia deve ser real, ou pelo menos verosímil.

2. Personagens.

3. Maravilhoso: a intervenção de entidades divinas / sobrenaturais:
. Pagão: a intervenção de deuses pagãos (os deuses gregos e romanos).
. Cristão: a presença do Deus do cristianismo.
. Mágico: as feitiçarias e crenças populares.
. Alegórico: os vícios ou as virtudes personificados (à semelhança da componente alegórica do Auto da Barca do Inferno).
4. Forma: texto narrativo em versos decassilábicos, soltos ou rimados, dispostos, geralmente, em oitavas.

5. A Epopeia

A epopeia é uma narrativa, geralmente em verso, que enaltece os feitos extraordinários de um herói ou de um povo, feitos esses que pressupõem um interesse universal. Ao longo de mais de vinte séculos, muitas foram as epopeias que viram a luz do dia.
  • Ilíada - séc. VIII a.C. - da autoria de Homero (?) - narra, em 24 cantos, tantos quantos as letras do alfabeto grego, as aventuras de Aquiles, o mais famoso dos heróis gregos, durante o último ano da guerra de Tróia.

  • Odisseia - séc. VIII a.C. - da autoria de Homero (?) - narra, em 24 cantos, as aventuras de Ulisses no regresso da guerra de Tróia até chegar a Ítaca, sua Pátria, onde o esperava Penélope, a esposa, modelo de fidelidade.

  • Eneida - séc. I a.C. - da autoria de Virgílio, poeta latino (70-19 a.C.) - em 12 cantos, narra as aventuras de Eneias e dos seus companheiros, desde a queda de Tróia até à fundação de Roma. Nesta epopeia, Virgílio imita a Odisseia nos seis primeiros cantos e a Ilíada nos seis últimos.

  • Cantar de Mio-Cid - séc. XI d.C. - autor desconhecido - retrata a luta contra os mouros.

  • Chanson de Roland - séc. XI d.C. - autor desconhecido - narra a derrota infligida pelos Bascos à retaguarda do exército de Carlos Magno, em 777, em Roncesvales, passagem dos Pirenéus.

  • Orlando Enamorado - séc. XV - da autoria de Boiardo (1441 - 1494) - obra estruturada em 69 cantos, que narra as aventuras cavaleirescas e amorosas, no contexto das lutas entre cristãos e mouros.

  • Orlando Furioso - séc. XVI - da autoria de Ariosto (1474 - 1533) - narra, em 46 cantos, as aventuras cavaleirescas e amorosas, no contexto das lutas entre cristãos e mouros.

  • Os Lusíadas - séc. XVI - da autoria de Camões (1524/25(?) - 1580) - em dez cantos, Camões procede à narração dos feitos gloriosos do povo português, culminando com a descoberta do caminho marítimo para a Índia.

  • Jerusalém Libertada - séc. XVI - da autoria de Torquato Tasso (1544 - 1595) - em vinte cantos, narra a conquista da Palestina por parte do exército da 1.ª Cruzada, tendo como herói Godofredo de Bulhões.

4. Cronologia de Camões

  • 1524 ou 1525 - Datas prováveis do nascimento de Luís Vaz de Camões, talvez em Lisboa.
  • 1548 - Desterro no Ribatejo; alista-se para o ultramar.
  • 1549 - Embarca para Ceuta, onde perde o olho direito numa escaramuça com os mouros.
  • 1551 - Regressa a Lisboa.
  • 1552 - Numa briga, fere um funcionário da cavalariça real e é preso.
  • 1553 - É libertado da prisão e embarca para o Oriente.
  • 1554 - Parte de Goa em perseguição de navios mercantes mouros, sob o comando de Fernão de Meneses.
  • 1556 - É nomeado provedor-mor em Macau; naufraga nas costas do Camboja.
  • 1562 - É preso por dívidas não pagas, sendo posteriormente libertado pelo vice-rei, conde de Redondo, e distinguido seu protegido.
  • 1567 - Segue para Moçambique.
  • 1570 - Regressa a Lisboa na nau Santa Clara.
  • 1572 - Sai a primeira edição d'Os Lusíadas.
  • 1579 ou 1580 - Morre de peste, em Lisboa, a 10 de Junho.

3. A descoberta do caminho marítimo para a Índia

A partir dos inícios do século XIV, Portugal centra a sua atenção no mar e reforça a sua condição marítima.
Um dos grandes feitos praticados pelos nautas portugueses foi a chegada à Índia por mar, uma empresa impulsionada por D. Manuel I que, em 1497, enviou uma armada de quatro navios, com cerca de cento e cinquenta homens, liderada por Vasco da Gama. O objectivo régio estava relacionado com as informações, enviadas por Pêro da Covilhã, que chegou a Calecute em 1488, ao seu antecessor, D. João II, segundo as quais aquela cidade indiana constituía um entreposto fundamental em todo o comércio do Oriente, disseminado por uma complexa rede que penetrava no golfo Pérsico e no mar Vermelho, outra que se dirigia para o golfo de Cambaia e mais duas para Bengala e para Malaca. D. Manuel I procurava, precisamente, «tomar conta» destas redes comerciais, daí ter enviado Vasco da Gama para negociar com o rei de Calecute um acordo de comércio, instalando aí uma feitoria portuguesa, se tal lhe fosse permitido, para dar início ao comércio de especiarias.

A frota de Vasco da Gama era constituída por quatro embarcações: as naus São Gabriel (capitaneada por Vasco da Gama) e São Rafael (comandada por Paula da Gama), uma caravela, ou uma nau (as opiniões a este respeito divergem), capitaneada por Nicolau Coelho, conhecida por Bérrio (nome cuja origem radica no apelido do seu piloto), e uma nau que servia como navio de apoio (comandada por Gonçalo Nunes).

A armada saiu da barra do Tejo, no Restelo, a 8 de Julho de 1497. Seguidamente, passou pelas Canárias, deteve-se em Cabo Verde, deu uma larga volta pelo Atlântico Sul e passou o Cabo da Boa Esperança em 22 de Novembro de 1497.

Entre o Natal desse ano e 24 de Abril de 1498, a armada explorou a costa oriental de África, e a 18 de Maio atingiu a Índia a norte de Cananor, tendo regressado a Lisboa em 10 de Julho de 1499.

A viagem encetada e concluída por Vasco da Gama abriu a Carreira da Índia, ou Rota do Cabo, isto é, a ligação marítima regular entre o Ocidente e o Oriente, o que possibilitou estabelecer trocas comerciais, alargar e consolidar o império português, difundir a língua e a cultura portuguesas e transmitir os valores e ideais da religião cristã. Por outro lado, permitiu aos europeus um conhecimento verdadeiro sobre o continente africano, o Oriente e a América do Sul, as suas gentes e costumes, a fauna e a flora.

2. Renascimento português - limites cronológicos

Não é possível estabelecer datas cronológicas precisas para o Renascimento em Portugal, ainda assim é consensual situá-lo entre meados do século XV e finais do século XVI, uma época de grande desenvolvimento do país e de afirmação no mundo.

1. A Época do Renascimento


A época do Renascimento modificou radicalmente o pensamento da Idade Média, na sua procura de construir uma época de modernidade, marcada pelas descobertas e progresso a todos os níveis.


A nível de contexto, são várias as rupturas que se estabelecem com o período anterior:



  1. No século XVI, o sistema feudal findou, o que porporcionou uma maior liberdade social e económica ao povo.


  2. Assim, a economia desenvolveu-se porque as pessoas começaram a produzir para si próprias, sem terem de pagar tributos aos senhores (feudais), podendo, depois, vender ou trocar os seus produtos.


  3. A curiosidade popular pelo desconhecido foi um dos factores que conduziu aos Descobrimentos portugueses (dos quais se destacam a descoberta do caminho marítimo para a Índia e a chegada ao Brasil).


  4. A aprendizagem teórica característica da Idade Média (Escolástica) foi substituída pelo desejo de obter um conhecimento «de experiência feito».


  5. Entretanto, em meados do século XV, Guttenberg criou a imprensa, o que tornou muito mais fácil a cópia, o acesso e a circulação do livro, uma vez que eram produzidos de forma mais célere e em maior quantidade.


  6. Em simultâneo com as descobertas, ocorreu um avanço da técnica de construção naval e dos instrumentos náuticos/de navegação.


  7. Entrementes, começou-se a questionar o poder exagerado da Igreja Católica, com sede em Roma.


  8. Erasmo de Roterdão e, posteriormente, Martinho Lutero defenderam a tradução da Bíblia para as línguas de cada país e a sua livre consulta e interpretação, o que, conjuntamente com outras ideias, levou à designada Reforma Protestante.


  9. Ao nível cultural, os autores desta época começaram a interessar-se pela Antiguidade Clássica grego-romana, visto que, não obstante tratar-se de civilizações muito antigas, continhm ainda uma modernidade e uma abertura de ideias que podiam servir de modelo.


  10. O Homem passou a ser o «centro do mundo» (antropocentrismo). Este interesse e valorização de tudo o que é humano tomou o nome de Humanismo.

    Homem de Vitrúvio



  11. O antropocentrismo substituiu o teocentrismo medieval, ideologia que punha Deus no centro do mundo e das preocupações humanas. Isto não significou que o Homem deixasse de acreditar na divindade, pelo contrário, e contava mesmo com a sua protecção, mas passou a acreditar, igualmente, que , através das suas acções, podia planificar o seu próprio destino, libertando-se da opressão e do medo da «castigadora mão divina».


  12. Mandaram-se construir palácios, praças, fontes, parques, todos os edifícios que se considerassem belos, confortáveis e úteis para o ser humano, por oposição às escuras catedrais e às fortalezas da Idade Média, destinadas a servir os interesses da Igreja e dos senhores feudais medievais.


  13. No que diz respeito à pintura e à escultura, redescobriu-se a beleza e a perfeição do corpo humano, o que está patente nos nus de Miguel Ângelo.

  14. Relativamente à música, o canto gregoriano (destinado aos mosteiros e às celebrações religiosas) foi substituído pelas chamadas músicas profanas de palácio, destinadas a animar o serões de festas.

  15. Ao nível da literatura, revaloriza-se a epopeia, destinada a glorificar grandes feitos e/ou os respectivos heróis, e a poesia amorosa.