segunda-feira, 26 de julho de 2010

5.2.2. Relações semânticas entre palavras

1. Relação de equivalência - Sinonímia

          A relação de sinonímia é a que se estabelece entre duas ou mais palavras que podem ser usados no mesmo contexto, sem que existe uma alteração de significado do enunciado em que ocorrem.
          Dito de outra forma: sinónimos são palavras que têm um significado idêntico, reenviando para o mesmo referente, mas significantes diferentes.

Exemplos:

     a) Eu penso que o Benfica está a sofrer demasiados golos.
     a') Eu julgo que o benfica está a sofrer demasiados golos.

     b) A Naomi Watts é uma mulher bela.
     b') A Naomi Watts é uma mulher linda.

          A «nova» gramática distingue entre sinónimos totais (palavras que se podem substituir em todos os contextos - ex.: cloreto de sódio / sal) e sinónimos parciais (palavras que se podem substituir apenas nalguns contextos - é o caso da maioria dos sinónimos).
          Atentemos nos seguintes exemplos, retirados do Dicionário Terminológico: nas frases «A minha mulher está doente.» e «A minha esposa está doente.», as palavras destacadas («mulher» e «esposa») são sinónimas; no entanto, na frase «A mulher é o sexo forte.», já não é possível considerar uma possível substituição da palavra sublinhada por «esposa», logo neste caso não funcionam como termos sinónimos.



2. Relação de oposição - Antonímia

          É a relação semântica entre duas ou mais palavras que, embora partilhando algumas propriedades semânticas que as relacionam, têm significados opostos.
          Antónimos são, assim, palavras que apresentam significados opostos / contrários:
                  » alto / baixo;
                  » gordo / magro;
                  » jovem / velho.

          Existem diversos tipos de antonímia:

     1) Antonímia contraditória: a relação de oposição entre as palavras implica uma exclusão recíproca:
               . vivo / morto;
               . solteiro / casado;
               . homem / mulher;
               . macho / fêmea.

     2) Antonímia contrária / graduável: neste caso, entre duas palavras de significado contrário existem um ou mais conceitos internédios, significando que a relação de oposição é graduável:
               . quente / frio  -  quente / morno / frio;
               . cheio / vazio  -  cheio / meio / vazio.

     3) Antonímia conversa: neste caso, a realçaõ de oposição obriga que, havendo inversão dos termos na frase, se utilize outra palavras para manter o mesmo sentido:
          a) Eu dei um presente ao João.
          a') O João recebeu o presente do pai.
          b) O Miguel é filho da Maria.
          b') A Maria é mãe do Miguel.

          Este tipo de antonímia ocorre sobretudo no campo das relações de parentesco (marido/mulher), dos intercâmbios sociais (médico/paciente) e das relações temporais e espaciais (antes/depois).



3. Relações de hierarquia  -  Hiperonímia e hiponímia

          A hiperonímia é uma relação de hierarquia semântica entre palavras, em que o significado de uma (o hiperónimo), por ser mais geral, inclui o de outras (os hipónimos).

          Por seu lado, a hiponímia é uma realção de hierarquia semântica entre palavras em que o signifcado de uma (o hipónimo), por ser mais específico, se encontra incluído no de outra (o hiperónimo).

          Assim, podemos falar em hiperónimo para designar o termo genérico onde podem ser incluídos vários elementos específicos dele dependentes semanticamente. Estes elementos específicos contidos na designação genérica são os hipónimos.

Exemplos:

     . animal (hiperónimo) → cão, gato, galinha, cobra, elefante, tigre, etc. (hipónimos);
     . flor (hiperónimo) → margarida, dália, magnólia, sardinheira, roseira, etc. (hipónimos).



4. Relações de parte-todo  -  Holonímia / Meronímia

          A holonímia é uma relação de hierarquia semântica entre palavras, em que o significado de uma (o holónimo) refere um todo do qual a outra (o merónimo) é parte constituinte.

          A meronímia é uma relação de hierarquia semântica entre palavras, em que o significado de uma  (o merónimo) remete para uma parte constituinte da outra (o holónimo).

Exemplos:

     . planta (holónimo) → raiz, caule, tronco, folhas, ramos, flores (merónimos);
    
     . casa (holónimo) → quarto, sala, cozinha, despensa (merónimos).


          De acordo com o Dicionário Terminológico, «As relações de holonímia/meronímia distinguem-se das de hiperonímia/hiponímia na medida em que nestas há uma transferência de propriedades semânticas que não se verificam naquelas. Por exemplo, "sardinha" é hipónimo de "peixe", porque também é "peixe". Já a palavra "escama" não pode ser encarada como um hipónimo de "peixe", uma vez que, apesar de ser uma parte do peixe (merónimo), não é um subtipo de peixe».


NOTA: Existe outro tipo de relações entre palavras (fónica e gráficas), as quais serão abordadas noutra secção desta «grammatica».


Fontes:

     » Dicionário Terminológico;
     » Ciberdúvidas da Língua Portuguesa;
     » Gramática Formativa de Português (Didáctica Editora).

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Reforma


          À semelhança do que Pedro Passos Coelho pretende fazer com a Constituição portuguesa, este blogue irá ser revisto, reformado, se quiserem.

          Assim, na medida do possível e do tempo disponível, procuraremos transformá-lo numa «gramática on-line», tendo em conta dois dados fundamentais: a revisão operada em termos de gramática da língua portuguesa e a implementação do Acordo Ortográfico, em princípio a partir de 1 de Setembro de 2011.

          O apoio prestado em termos de conteúdos do programa de Português do 12.º ano passará a ter a sua residência no blogue criado há ano e meio para participar num concurso, promovido pelo PNL, sobre o romance de D. Pedro I e D. Inês de Castro. Por enquanto, o dito manterá a sua «morada»:  http://portugues-fcr.blogspot.com/ . Posteriormente, sofrerá a sua própria reforma.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Matemática, essa besta negra!

          Daqui a menos de cinco horas, umas dezenas de milhar de alunos confrontar-se-ão, pela segunda vez este ano, com o exame de Matemática A.
          Este momento fez-nos recuperar uma notícia do Público de há três semanas, que informava que o Instituto Superior Técnico, da Universidade Técnica de Lisboa, realizou há uns anos uma prova de aferição para testar as dificuldades de que os seus alunos eram portadores (à saída do ensino secundário). Uma das perguntas era simples: quanto é um meio mais um meio? Além disso, era de escolha mútipla. Não obstante, 27 %, isto é, mais de um quarto dos alunos, não souberam responder.
          Como é isto possível?
          Vamos por partes. Por mera brincadeira, tentei resolver o exame de Matemática do 9.º ano de 2010. Para minha grande surpresa, constatei que praticamente metade do dito era resolúvel usando apenas o senso comum, daí que tenha obtido uma pontuação entre os 45 e os 50 pontos, deixando de lado equações e outro tipo de exercícios que do «meu» programa não faziam parte. Talvez resida aqui uma das explicações: se eu consegui aquele brilharete, como é que cerca de 50% dos alunos do 9.º ano não o conseguiram?
          Na notícia acima referida, os professores do ensino superior com quem a jornalista chegou à fala deixaram escapar uma série de ideias que sintetizo nas seguintes citações: «(ausência de) hábitos de trabalho e (de) espírito de sacrifício»; «cultura de facilitismo»; «comportamento»; «Classifico-os como uma geração wikipedia: satisfazem-se muito facilmente com conhecimentos superficiais»; «Há ausência de consolidação de conceitos e os alunos estão viciados no uso da calculadora.»; «São ensinados a não pensar...»; «há menos maturidade»; «É preciso treinar o raciocínio abstracto e a verdade é que já nem sabem somar fracções, multiplicar potências...»; «... ao disseminar-se a ideia de que o ensino tem de ser muito divertido esqueceu-se a importância, por exemplo, da memorização.»; «Tenho muitos alunos que não sabem a tabuada e que ainda contam pelos dedos...»; «Criou-se a ideia de que a aprendizagem não é dolorosa. Há um culto do facilitismo e de desvalorizar o conhecimento que se acentuou com os cursos de três anos [referência a Bolonha]».
          E, no entanto, no meio desta noite de breu, duas afirmações: «... os alunos de hoje não são menos inteligentes, não se trabalha é o que têm...»; «Os alunos são igualmente inteligentes. A formação é que é o problema.».
          De quem é a CULPA deste CRIME? Há um edifício em Lisboa que a tem vindo a armazenar há duas décadas. Não haverá por aí nenhum Ben Laden que a derrube?


quarta-feira, 14 de julho de 2010

Exame Nacional 2010 (2.ª Fase) - Correcção

GRUPO  I

A

1. Scarlatti está na iminência de conhecer o «segredo», isto é, a passarola, tendo sido conduzido ao local onde ela está a ser construída pelo padre Bartolomeu Lourenço. Não obstante, como foi dito, se encontrar prestes a contactar com obra tão misteriosa, Scarlatti não mostra qualquer traço de ansiedade; pelo contrário, apresenta-se calmo e despreocupado («... olhava tranquilo...»), sem curiosidade, sem surpresa com o que o rodeia («Não parecia curioso do que o rodeava...»). Por outro lado, no exacto momento em que se prepara para conhecer o «segredo» ao retirar a venda, Scarlatti continua mostrar-se tranquilo, sem precipitação («Sem precipitação, tão tranquilamente como antes...»), bem disposto e em «comunhão» com o padre («Só de olhos vendados se chega ao sagredo, disse, sorrindo, e o músico respondeu, em tom igual.»).

2. O padre Bartolomeu informa Scarlatti de que terá de o vendar para ter acesso ao «segredo» («Só de olhos vendados se chega ao segredo...»). A resposta do músico pode traduzir uma das seguintes ideias:
          » o segredo permanece desconhecido porque não é passível de ser conhecido;
          » o segredo não é passível de ser conhecido pelas pessoas, pois situa-se no domínio do irracional;
          » o segredo não é traduzível palas noções comuns, logo por palavras;
          » ...

3. Scarlatti, antes de mais, percepciona a passarola como um instrumento musical («... pousou as mãos numa das asas como se ela fosse um teclado...»), daí que provoque a sua vibração quando coloca as mãos sobre uma das asas («... toda a ave vibrou apesar do seu grande peso...»). Por outro lado, procura conhecer o segredo do voo, pois verifica que as asas são fixas e as aves necessitam de as bater para voar. Ou seja, ele procura uma explicação científica, racional para a passarola e o seu voo («Nenhuma ave pode voar sem bater as asas...»).
          Já Baltasar, o «mecânico» da obra idealizada pelo padre, aquele que pôs o seu vigor, a sua força física ao serviço da construção da passarola, percepciona-a a partir do seu próprio trabalho e esforço denodado («... sempre era ele o mecânico, e além disso estava sujo, enfarruscado da forja, em todo ele só brilhava o gancho, do muito e constante trabalho.»), bem como da sua crença segundo a qual «... basta ter a forma de ave para voar...».

4. O excerto «... perdoemos-lhe a óbvia comparação clássica...» constitui uma crítica à comparação estereotipada de Scarlatti.
          O excerto «... sabe ele lá como é o corpo de Blimunda debaixo das roupas grosseiras que veste...» remete para o desconhecimento, por parte de Scarlatti, do corpo de Blimunda, iludido pelas vespes gastas e pobres, ou destaca a beleza física da companheira de Baltasar.
          O excerto «... e Baltasar não é apenas o tição negro que parece, além de não ser coxo como foi Vulcano, maneta sim, mas isso também Deus é.» destaca a superioridade de Baltasar em relação a Vulcano (não é coxo) e a sua «proximidade» com a divindade cristão (ambas são «manetas»). Daqui resulta uma espécie de deificação do humano.
          O quarto excerto («Sem falar que a Vénus cantariam todos os galos do mundo se tivesse os olhos que Blimunda tem...») sublima o poder especial dos seus olhos e a sua superioridade relativamente aos deuses (deificação do ser humano).
          O derradeiro excerto («... sobre Vulcano também Baltasar ganha, porque se o deus perdeu a deusa, este homem não perderá a mulher.»), além de, novamente, sublimar a superioridade do humano relativamente ao divino, enfatiza o amor e a fidelidade existentes entre Baltasar e Blimunda, o que não sucedeu com os dois deuses.



B

1. Papel de Matilde na denúncia da injustiça e da corrupção:
» Após a prisão do general, Matilde tudo faz para o libertar;
» Quando constata a impossibilidade de concretizar as suas intenções, dirige-se de forma crítica e agressiva aos três governadores, apelidando-os, por exemplo, de «cães», «covardes», «opressores», «tiranos», «hipócritas», etc.;
» Acusa os governadores de terem prendido um inocente;
» Acusa-os ainda de terem recorrido à denúncia e ao suborno para obterem a prisão e condenação;
» Chega a comparar principal Sousa a Judas, símbolo da traição bíblica.
» ...



GRUPO  II

VERSÃO 1

1. - c

2. - a

3. - d

4. - c

5. - b

6. - d

7. - b

8.
     a - 3
     b - 5
     c - 1
     d - 8
     e - 2


VERSÃO 2

1. - a

2. - b

3. - a

4. - d

5. - a

6. - c

7. - c

8.
     a - 4
     b - 3
     c - 2
     d - 5
     e - 6



GRUPO  III

. Introdução:

     - Ponto de partida: definir uma «tese» a partir do tema proposto (consequências da acção do Homem no planeta Terra) e interligada à citação de Cousteau (o mau uso do progresso tecnológico), que aponta para efeitos negativos.


. Desenvolvimento:

     - 1.º argumento: os efeitos do uso das tecnologias no aumento da poluição.

          . 1.º exemplo: a evolução e o recurso intensivo aos transportes (o automóvel, o avião...) e a fontes de energia provocam o aumento das emissões de dióxido de carbono (» efeito de estufa » mudanças climáticas);

          . 2.º exemplo (ligado preferencialmente à inconsciência e ao desleixo para que remete a citação de Costeau): os despejos de resíduos industriais em cursos de água naturais (a lavagem de tanques de navios petrolíferos em alto mar...).

     - 2.º argumento: a industrialização e a necessidade cada vez maior de recursos contribuíram para o desgaste do planeta e dos seus recursos naturais, para a destruição dos ecossistemas...

          . 1.º exemplo: o afundamento da plataforma petrolífera da BP ao largo da costa dos EUA e os reflexos que está a ter na vida (fauna, flora...) da área afectada.

      - Contra-argumentos:

                    a) o aproveitamento da tecnologia para uma melhor qualidade de vida do ser humano (exemplo: ar condicionado, aquecimento central, Internet...);
                    b) o desenvolvimento de tecnologias e energias não poluentes (a energia solar, eólica, marés...), mas
                    c) também com impactos negativos a nível da paisagem e da desflorestação.


. Conclusão:

          a) A acção humana e os progressos tecnológicos resultam em benefício da vida e, em simultâneo, em prejuízo do planeta e do seu equilíbrio ecológico;

          b) A necessidade de maior investimento nas tecnologias não poluentes e energias alternativas.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Resultados do 9.º Ano



          Saíram, hoje, os resultados dos exames nacionais do 9.º ano. A situação pode resumir-se da seguinte forma: os resultados a Matemática desceram para um nível sofrível (a média desce de 57% para 50%) e a Língua Portuguesa conservam-se num patamar de «excelência»: 56%.
          O vídeo ilustra os métodos que o ME pretende implementar no sistema educativo: Matemática criativa.

domingo, 11 de julho de 2010

Público - A saúde mental dos portugueses


          Alguns dedicam-se obsessivamente aos números e às estatísticas esquecendo que a sociedade é feita de pessoas.

          Recentemente, ficámos a saber, através do primeiro estudo epidemiológico nacional de Saúde Mental, que Portugal é o país da Europa com a maior prevalência de doenças mentais na população. No último ano, um em cada cinco portugueses sofreu de uma doença psiquiátrica (23%) e quase metade (43%) já teve uma destas perturbações durante a vida.
          Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque assisto com impotência a uma sociedade perturbada e doente em que violência, urdida nos jogos e na televisão, faz parte da ração diária das crianças e adolescentes. Neste redil de insanidade, vejo jovens infantilizados incapazes de construírem um projecto de vida, escravos dos seus insaciáveis desejos e adulados por pais que satisfazem todos os seus caprichos, expiando uma culpa muitas vezes imaginária. Na escola, estes jovens adquiriram um estatuto de semideus, pois todos terão de fazer um esforço sobrenatural para lhes imprimirem a vontade de adquirir conhecimentos, ainda que estes não o desejem. É natural que assim seja, dado que a actual sociedade os inebria de direitos, criando-lhes a ilusão absurda de que podem ser mestres de si próprios.
          Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque, nos últimos quinze anos, o divórcio quintuplicou, alcançando 60 divórcios por cada 100 casamentos (dados de 2008). As crises conjugais são também um reflexo das crises sociais. Se não houver vínculos estáveis entre seres humanos não existe uma sociedade forte, capaz de criar empresas sólidas e fomentar a prosperidade. Enquanto o legislador se entretém maquinalmente a produzir leis que entronizam o divórcio sem culpa, deparo-me com mulheres compungidas, reféns do estado de alma dos ex-cônjuges para lhes garantirem o pagamento da miserável pensão de alimentos.
          Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque se torna cada vez mais difícil, para quem tem filhos, conciliar o trabalho e a família. Nas empresas, os directores insanos consideram que a presença prolongada no trabalho é sinónimo de maior compromisso e produtividade. Portanto é fácil perceber que, para quem perde cerca de três horas nas deslocações diárias entre o trabalho, a escola e a casa, seja difícil ter tempo para os filhos. Recordo o rosto de uma mãe marejado de lágrimas e com o coração dilacerado por andar tão cansada que quase se tornou impossível brincar com o seu filho de três anos.
          Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque a taxa de desemprego em Portugal afecta mais de meio milhão de cidadãos. Tenho presenciado muitos casos de homens e mulheres que, humilhados pela falta de trabalho, se sentem rendidos e impotentes perante a maldição da pobreza. Observo as suas mãos, calejadas pelo trabalho manual, tornadas inúteis, segurando um papel encardido da Segurança Social.
          Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque é difícil aceitar que alguém sobreviva dignamente com pouco mais de 600 euros por mês, enquanto outros, sem mérito e trabalho, se dedicam impunemente à actividade da pilhagem do erário público. Fito com assombro e complacência os olhos de revolta daqueles que estão cansados de escutar repetidamente que é necessário fazer mais sacrifícios quando já há muito foram dizimados pela praga da miséria.
          Finalmente, interessa-me a saúde mental de alguns portugueses com responsabilidades governativas porque se dedicam obsessivamente aos números e às estatísticas esquecendo que a sociedade é feita de pessoas. Entretanto, com a sua displicência e inépcia, construíram um mecanismo oleado que vai inexoravelmente triturando as mentes sãs de um povo, criando condições sociais que favorecem uma decadência neuronal colectiva, multiplicando, deste modo, as doenças mentais.
          E hesito em prescrever antidepressivos e ansiolíticos a quem tem o estômago vazio e a cabeça cheia de promessas de uma justiça que se há-de concretizar; e luto contra o demónio do desespero, mas sinto uma inquietação culposa diante destes rostos que me visitam diariamente.

Pedro Afonso
Médico psiquiatra

sábado, 10 de julho de 2010

The end is near

Uma reflexão

          Terminada a primeira fase dos exames nacionais e entregue o portefólio referente ao curso de formação - novos programas de Português do ensino básico -, sobram, finalmente, uns minutinhos para reflectir sobre o exame do 12.º ano.
          Sobre o enunciado propriamente dito, nada de extraordinário a reportar, tendo presente que a estrutura é semelhante à dos últimos anos.
          A primeira dificuldade do questionário respeitante ao texto A residia na obra seleccionada: Os Lusíadas. Para muito alunos, a linguagem de Camões continua de tão difícil descodificação quanto no 9.º ano, mesmos aos 17 / 18 anos, mesmo quando parte do excerto foi lido na aula. Por outro lado, as respostas ao questionário em pouco ou nada dependiam do conhecimento da obra.
          A resposta à pergunta B implicava um conhecimento mínimo de Memorial do Convento, no entanto quem não leu a obra dificilmente terá dado uma resposta com «cabeça, tronco e membros».
          Sobre o exercício de leitura de escolha múltipla, escuso-me a tecer comentários, pois não me parece que faça qualquer sentido esta tipologia de questões.
          Relativamente à gramática, os exercícios pouco ou nada têm de gramaticais. Ou são despropositados (a pergunta sobre modos e tempos verbais; as questões sobre léxico quando não era isso que se pretendia avaliar) ou não correspondem a nada. Dito de outra forma, as perguntas de gramática não avaliam conhecimentos gramaticais, para mais quando vêm embrulhadas num linguajar complexo.
          O grupo III... Muita boa gente se pronunciou contra o tema por achar que não fazia sentido e que os alunos não seriam capazes de... De facto, o tema, tendo em mente que estaríamos na presença de um texto argumentativo, não era propriamente adequado a esta tipologia. Todavia, se os alunos tivessem parado quinze minutos para ler atentamente o enunciado e pensar nos dois argumentos e nos dois exemplos; tivessem preparado, na folha de rascunho, um pequeno plano, sob a forma de tópicos, e só depois passassem à redacção do texto, outro galo cantaria. Como, porém, «isso» dá trabalho e é uma «seca», vamos lá fazer de conta que somos Eças e escrevamos o texto à primeira, esquecendo que Eça escrevia, reescrevia, reformulava vezes sem conta até se dar por minimamente satisfeito.
          Por último, há a questão da capacidade de escrita, que, no fundo, é um dos elementos decisivos entre um nove ou um dez e um treze ou catorze. Porém, quanto a isso, mais do que um bom professor, o fundamental é ler muito e desde tenra idade.

          O GAVE tem procurado, incessantemente, alcançar a objectividade no processo de correcção dos exames de Português, pelo que introduziu, há uns anos, os descritores de desempenho. Seria mais adequado, nesta demanda da objectividade, que o exame fosse todo constituído por perguntas de escolha múltipla e associação. Caricatura à parte, convém dizer que  os descritores de desempenho não impediram a subjectividade, visto que não cobrem todas as formulações dos alunos (como seria de prever), por um lado, e se prestam eles próprios à subjectividade, por outro. Basta ler os descritores referentes à primeira pergunta para se extrair esta conclusão.
          Depois, há a questão das diferenças de correcção do mesmo corrector e entre correctores. Todos sabemos que a correcção de uma pergunta iniciada de manhã e continuada à tarde não é efectuada da mesma maneira pelo mesmo corrector. Há estudos que apontam, neste processo, para um desvio padrão de 1, 2 valores. No que diz respeito à comparação entre correctores, uns «aceitam» tudo e outros são extremamente rigorosos.

          Para finalizar, tendo em conta todos estes dados e outros que se tornaria fastidioso enumerar, um conselho a todos os alunos: vão à 2.ª fase. Porquê? Entre outras razões, há a considerar que o «espírito de correcção» é muito mais suave. Desde que vi, em plena praia, a alguns metros, um sujeito qualquer a corrigir (isto é, a reapreciar) provas de exame de Matemática em cima do areal, nada mais me surpreende. Assim sendo, vão, deitem o barro à parede e logo se vê. Não é um grande conselho nem são brilhantes os argumentos, mas é o ensino que vamos tendo.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Resultados

          Aqui!

          Desde 2008, é sempre a descer.

500.ª mensagem

          500.ª mensagem...
          Para dizer o quê?
          1.º) Saíram, hoje, os resultados dos exames naconais.
          2.º) Não fui ver as notas, nem irei tão cedo, mas não espero grande coisa.
          3.º) Dos que corrigi, de outras escolas, obviamente, a nota mais alta foi 14 e a mais baixa 0,6.
          4.º) Maria de Lurdes Rodrigues tem toda a razão naquilo que escreveu no livro que publicou recentemente: a escola pública nunca mais foi a mesma depois do seu consulado. Mas, como diz o ditado popular, «atrás me mim virá quem de mim bom fará.»