terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Mário Crespo avalia a Ministra da Educação


Porque a realidade excede os meus dotes ficcionais, esta Ficha de Avaliação da Doutora Maria de Lurdes Rodrigues, Ministra da Educação, assenta nos critérios seguidos pelo seu Ministério incluindo, a terminologia usada na avaliação de docentes, o número de alíneas e a bitola de classificação.
Níveis de Pontuação: Mínimo 3, máximo 10.
A - Preparação e execução de actividades.
A - 1 Correcção científico-pedagógica e didáctica da planificação.
Classificação obtida - Nível 3
(Não efectuou as reformas previstas no Programa do Governo por falta de trabalho preparatório. As cenas de pugilato, luta greco-romana e intimidação por arma de fogo simulada nas áreas que lhe foram confiadas vão originar um aumento significativo da despesa pública com a contratação à Blackwater (por ajuste directo) de um mercenário israelita por cada sala de aula e dois nas salas dependentes da DREN).
A - 2 Adequação de estratégias.
Classificação obtida - Nível 3
(Não definiu linhas de rumo nem planos de acção que permitissem concretizar a missão delineada, usando como benchmarking nacional os parâmetros seguidos no sistema educativo da Faixa de Gaza.)
A - 3 Adaptação da planificação e das estratégias.
Classificação obtida - Nível 3
(Não obteve eficácia aferível em três anos de actividade, consumindo no processo a maior parcela de verba pública atribuída a um Ministério. Insistiu em manter o organograma dos seus serviços (em particular da DREN) inspirado no modelo das Tentações de Santo Antão de Jeronimus Bosh).
A - 4 Diversidade, adequação e correcção científico-pedagógica das metodologias e recursos utilizados.
Classificação obtida - Nível 3
(A observação empírica dos resultados é indiciária de um inadequado e/ou incorrecto aproveitamento de recursos disponibilizados em sucessivos Orçamentos de Estado em tal monta que fazem o BPP parecer uma operação rentável. Adicionalmente, o seu Ministério atingiu tal desordem que faz a Assembleia Geral do Benfica parecer um retiro de monges Cartuxos).
B - Realização de actividades.
Classificação obtida - Nível 3
(A avaliação conclui que à incapacidade da avaliada na “promoção de clima favorável” se junta a insuficiência de valências de conhecimentos gerais essenciais, como o atesta a confusão que fez a 23 de Junho de 2005 pp. em entrevista televisionada, falhando na distinção entre “República” e “Governo da República”. Isto deu novas dimensões ao Estatuto da Autonomia dos Açores e inspirou o Chefe do Estado a crescentes afrontas à vontade do Parlamento com graves e desgastantes consequências para o executivo.
Nas secções C e D da Ficha de Avaliação do Ministério da Educação, nos quatro subgrupos, a avaliada obteve oito classificações de Nível 3, pelo que, feita a média aritmética dos dezasseis parâmetros cotados lhe é atribuída a classificação geral de Insuficiente. Recomenda-se que sejam propostas à Doutora Maria de Lurdes Rodrigues as seguintes opções: integrar o quadro de mobilidade especial até colocação em Baucau; frequentar um curso das Novas Oportunidades e/ou filiar-se no Movimento Esperança Portugal; aceitar o 12º lugar na lista de espera para o próximo Conselho de Administração da FLAD; frequentar o curso de formação do INA - Limites da Autonomia Regional; ser animadora de As Tardes de Maria de Lurdes na RTP África; integrar a quota ainda disponível para antigos executivos socialistas na Mota Engil, Iberdrola ou BCP.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Estamos prontos... para a VIDA?

Rod Stewart na voz e Jeff Beck na guitarra, num original de...

Mais uma vez, os fabulosos anos OITENTA!

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Férias à porta!

Depois de um período complicado, todos merecemos umas feriazinhas. Então, que venham elas!



terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Informações - Exame Nacional 2009

Já saíram as informações relativas ao exame nacional de Português do ano lectivo de 2008/2009.

Matriz - Exames Nacionais - 12.º Ano
Matriz - Exames Nacionais - 12.º Ano Sisifo

Balada do V Ano Jurídico

No final do ano passado, numa estulta tentativa de aguçar o apetite de quem se preparava para frequentar o ensino superior e de antecipar, de certa forma, o espírito académico, tomando como referência, no que à tradição diz respeito, a universidade de Coimbra, postei um vídeo referente à Balada do 5.º Ano Jurídico, interpretada pelo grupo Lacrima.


O «post» é novo, o tema o mesmo, mas no seu original. Eis, pois, a Balada do V Ano Jurídico, tocada e cantada pelos seus criadores: grupo Toada Coimbrã, ano de 1989, na Sé Velha, Coimbra, Portugal.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Electric Dreams

A década de 80 foi um período marcante para quem a viveu, sobretudo para quem nela fez a transição da infância para a adolescência e, posteriormente, para o estado semi-adulto.

À semelhança dos referentes aos Tears for Fears, ou aos Buggles, este vídeo de Electric Dreams, música da autoria de Giorgio Moroder e cantado por Phil Oakley, serviu de pano de fundo de um filme qualquer.

Preencheu algumas noites de sonhos...



O Andaime

Fernando Pessoa intitulou o poema de "O Andaime", aparecendo a mesma palavra na última estrofe da composição. Andaime é um vocábulo de origem árabe que os dicionários descrevem como uma armação de madeira ou ferro de que se servem os pedreiros para construir um edifício, sendo desmontada após a construção. É também utilizado para restauro de paredes de edifícios arruinados. Porquê o andaime nesta composição? Diz António Quadros que há sempre na poesia de Pessoa «um trilho para as alturas, uma temática de levitação para além de tudo» (Quadros, 1987: 62). Palavras como sol, sobe e o próprio andaime são disso testemunhas no poema em análise.

O andaime é um meio de fazer erguer, para elevar às alturas, as paredes de uma casa. No poema, a casa é a vida do poeta. Contrapõe-se a altura do sol e do andaime à planura do rio e do mar. a «casa por fabricar» é o que nunca chegou a ser; o andaime as esperanças irrealizáveis, o projecto inconcluso, a ilusão que se revelou numa mentira. O andaime, afinal, não serviu para construir a casa; era inútil como a vida e seus anseios.

A casa, na simbologia geral, é o centro do mundo e significa o ser interior, o refúgio íntimo de cada homem. Nesta composição, o poeta sente-se vazio, pois a casa não chegou a ser edificada. O seu interior, a sua alma, é um vácuo enorme rodeado por um andaime inútil.

Fernando Pessoa tem uma imaginação aquática por excelência. É quase obsessivo o tema da água na sua obra. Lembremo-nos das odes de Álvaro de Campos, um engenheiro naval, e da Mensagem. No poema em análise temos o rio, as ondas, as águas lentas e mansas, o mar.

O rio, como escoamento das águas, é símbolo de fertilidade, de morte e de renovação. A corrente é a vida; a água descendo para o oceano e o ajuntamento das águas o retorno à indiferenciação (cf. Chevalier, 1982: 449). O poeta recorda o seu passado olhando as ondas do rio. Elas lembram-lhe a vida «vivida em vão». O «correr vazio» do rio é como a própria vida. O poeta está na margem sossegado e não encontra nenhuma razão para explicar o seu sossego. Antes pelo contrário, deveria estar agitado, inconformado com aquilo em que se tornou. Olha com indiferença as ondas, ouvindo o «som morto das águas». Tudo passa, tudo vai, como a corrente do rio. A velha ideia heraclitiana está aqui bem presente. No fragmento 12 da edição de Diels, diz Heraclito: «ceux qui entrent dans les mêsmes fleuves reçoivent le courant d'autres et d'autres eaux et les âmes s'exhalent des substance humides».

As ondas indicam uma ruptura com a vida habitual, uma mudança nas ideias, atitudes, nos comportamentos do sujeito (Chevalier, 1982: 450). O poeta de "O Andaime" descreve-as tão leves que nem são «ondas sequer». O corte entre o passado e a tomada de consciência no presente é radical. Todo o seu passado foi um grande erro, um engano colossal.

As águas lentas e mansas remetem-nos para a obra de Bachelard, L'Eau et les Rêves. Diz Bachelard que a água leva «au loin, l'eau passe comme les jours» (Bachelard: 125). «Elle este une substance pleine de réminiscenses et de rêveries divinatrices» (Ibidem: 122). É a mestra da linguagem fluida, da linguagem sem choques, contínua, da linguagem que abranda o ritmo, que transforma em matéria uniforme os ritmos diferentes (cf. Ibidem: 250). Paul Claudel dizia que tudo o que o coração deseja se pode reduzir à figura da água.

As águas calmas e lentas simbolizam o desejo da morte: «pour certaines âmes, l'eau tient vraiment la mort dans sa substance. Elle comunique une rêverie où l'horreur est lente et tranquile» (Bachelard: 122; cf. Ibidem: 66). As águas mansas funcionam como um convite à morte. Para Heraclito, a morte era a própria água. É expressivo o uso do adjectivo morto no poema de Pessoa, associado ao som das águas e ao eu do poeta.

O mar é símbolo da dinâmica da vida. Tudo sai do mar e a ele regressa. Aí se nasce e aí se morre. É a encarnação da Grande Mãe, de que fala Gilbert Durand. O poeta pede às ondas que o levem «Para o olvido do mar». É o desejo do retorno ao seio materno, à indiferenciação. Só o mar é remédio, só as suas águas o podem envolver no esquecimento.

O complexo de Caronte, assim designado por Bachelard, parece reflectir-se neste poema de Fernando Pessoa. O apelo que o poeta faz às ondas para que o levem, lembra um outro de Baudelaire em Les Fleures du Mal: «O mort, vieux capitaine, il est temps! Levons l'ancre!» Tudo o que de lento há na morte é marcado pela figura do barqueiro horrível. As ondas, o rio que corre, são o caminho de Caronte a transportar a alma do poeta para o mar alto, o túmulo do «olvido». O rio não é o objectivo, mas o meio para alcançar a paz plena do mar e do indefinido.

Na Teogonia de Hesíodo, a água doce estagnada dos rios e a água fecunda e furiosa do oceano antagonizam-se. a paz que o poeta deseja não é o marasmo, a inércia que sobre si se abate quando olha o rio preguiçoso. É a paz espumante do oceano, larga e abrupta numa eterna aventura desigual e única. Talvez do mar renasça um novo ser e a vida recomece, menos ilusória, menos enganadora.

Sabemos que o sonho é um veículo de criação de símbolos. Fernando Pessoa é um sonhador. Ele próprio o diz: «Toda a minha vida foi de passividade e de sonho».

O cepticismo pela vida real transforma-se, no poema "O Andaime", num cepticismo pela vida de sonho. O poeta encara o passado como um sonho vão. Nada do que sonhara se realizou, a sua vida foi uma inteira desilusão. O estado natural do poeta era o sonho. Como a realidade era dolorosa, efémera, rotineira, refugiava-se na fantasia. O alívio, diz João Mendes, procurava-o «no sonho, não só como evasão da vida angustiada e sem solução; mas porque de facto o sonho se torna mais verdadeiro que a realidade concreta» (Mendes, 1983: 287). Porém, em "O Andaime", o poeta descobre que também o sonho é enganador e absurdo. A vida e o sonho são ambos sonhos. Nada é útil para resolver o conflito interior. Resta a morte, o «olvido». A futilidade da vida consciente e o absurdo do inconsciente obrigam o poeta a preferir o seio do mar.

A infância é símbolo da inocência e da simplicidade, o estado anterior ao erro. A saudade do tempo de criança é uma constante que atravessa toda a obra de Fernando Pessoa. Sabemos que até aos seis anos ele fora exclusivamente o «menino de sua mãe» e que, a partir daí, tivera de repartir com os seus irmãos recém-chegados essa exclusividade. Tal evento «repercutiu-se-lhe profundamente na alma, tornando-se uma criança e depois um jovem ensimesmado, solitário, introspectivo, melancólico, que procurou sucessivos escapes para a situação ressentida como de abandono e dupla orfandade» (Quadros, 1987: 24). Também no poema "O Andaime" parece delinear-se esta problemática, implicitamente no desejo de retorno ao seio materno atrás explicitado, e na alusão à «bola de criança». Na quintilha terceira, o poeta compara a sua esperança e o seu desejo a uma bola. A bola atirada por uma criança ao alto sobe mais do que a esperança que sente, do que o desejo que tem. As crianças são solícitas. Ele, ao contrário, é morno, quase frio, impotente de vontade. Talvez quando criança fosse mais perseverante nos seus desejos e esperanças.

As recordações afluem-lhe à memória com a correnteza fluvial. Mas essa correnteza leva, juntamente com as esperanças, os sonhos irrealizáveis. O poeta está de mãos vazios perante o rio que corre. Ressalta um sentimento de fatalidade angustiante, «de fracasso metafísico, de queda de um sonho anterior» (Quadros, 1987: 56). As esperanças estão mortas porque já não acredita nelas; mas hão-de morrer porque ainda não as esqueceu. O poeta sente-se um morto, como cadáver que deu à margem do rio.

Mantinha-o uma visão irreal, impossível: «Só no palco era rainha / Despiu-se e o reino acabou». Ele encontrou-se, «Quando estava já perdido». É como chegar atrasado a um encontro que não foi marcado. Tal como um louco, teimava no que não tinha solução. A sensação de loucura é própria de alguém que choca com a realidade e que não a aceita ou a compreende de uma forma desviante. Agora cai em si e vê o engano. Apenas um sonho liga o seu pensamento ao corpo: ser muro de jardim.

A simbologia do muro e do jardim tem a sua importância para a compreensão do poema. O muro simboliza a comunicação cortada, interrompida. Pode servir para defesa, protecção, mas é ao mesmo tempo símbolo de cárcere. O jardim simboliza o paraíso terrestre, celeste ou cósmico. Aparece nos sonhos como a expressão de um desejo puro. O muro de jardim mantém as forças internas que florescem. Não se penetra no jardim senão por uma porta estreita (Cf. Chevalier, 1982: 531-533). Contudo, o poeta fala de um «deserto jardim». Não tem árvores nem canteiros de flores. Está deserto como a sua própria alma. Deste modo, o paraíso que o jardim simboliza torna-se o vazio, a ausência da felicidade; o muro o corte, o impedimento de realizar o sonhado. O corpo do poeta é o muro da alma, o guardião, a defesa do que já nada há para guardar. O jardim é a sua alma árida e deserta, sem sonhos, sem vida, sem passado, sem futuro.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

ORPHEU

A revista Orpheu pretendia ser uma publicação trimestral de literatura, destinada a Portugal e ao Brasil, no entanto não ultrapassou as duas primeiras edições.
O primeiro número foi dado à estampa em 1915, correspondente aos meses de Janeiro, Fevereiro e Março, e era constituído por 83 páginas, impressas em excelente papel de tipo elegante. Abria com uma «Introdução», da autoria de Luís de Montalvor, que pretendia definir os objectivos da publicação, produto de um grupo de jovens autores que se reuniam, com frequência, nalguns cafés da baixa lisboeta.
A pretensão deste grupo «é formar, em grupo ou ideia, um número escolhido de revelações em pensamento ou arte, que sobre este princípio aristocrático tenham em Orpheu o seu ideal esotérico e bem nosso de nos sentirmos e conhecermos».
Por alturas do rebentar da Primeira Guerra Mundial, conheceram-se em Lisboa Fernando Pessoa, cuja adolescência tinha sido passada na África do Sul, em contacto com a cultura inglesa; Mário de Sá-Carneiro, que, entre 1913 e 1916, passou grande parte do tempo em Paris; Almada Negreiros e Santa-Rita Pintor, que trouxeram da capital francesa as novidades literárias e plásticas, nomeadamente o futurismo e correntes afins.
Na época, estas figuras foram apelidadas de loucas e só posteriormente foram reconhecidas como fazendo eco de um sentimento geral de crise latente.
O projecto do Orpheu nasceu por volta de 1914, graças a Luís de Montalvor, acabado de regressar do Brasil, que pretendia o lançamento de uma revista luso-brasileira. Dela saíram dois números (os únicos publicados), ambos em 1915. Neles, é possível encontrar textos de Fernando Pessoa, Sá-Carneiro, Almada Negreiros, Luís de Montalvor, Cortes Rodrigues, todos portugueses, bem como dos brasileiros Ronald de Carvalho (que, regressado do Brasil, constituiria a ponte que unia os modernismos brasileiro e português) e Eduardo Guimarães. Outras colaborações pertenceram a figuras como Ângelo de Lima, internado no manicómio, ou Álvaro de Campos, heterónimo de Pessoa.
O primeiro número, saído em Abril, esgotou-se no espaço de três semanas. Não se conclua, no entanto, do seu sucesso, pois as pessoas adquiriram a revista para se horrorizarem com o seu conteúdo e soltarem a sua raiva contra os que nela colaboraram. Armando Cortes Rodrigues relatou que os autores órficos eram apontados a dedo quando passavam na rua, olhados com ironia e escárnio e julgados loucos, pelo que para eles reclamavam o internamento urgente no hospício de Rilhafoles.
Mais tarde, em Julho de 1915, saiu o segundo número, este com um conteúdo claramente futurista. O terceiro número chegou a estar impresso, em parte, mas acabou por não chegar junto do público por falta de verba para a sua publicação, pois as edições anteriores tinham sido financiadas pelo pai de Mário de Sá-Carneiro. O suícidio do próprio Sá-Carneiro, em 1916, em Paris, agudizou a crise e Orpheu morreu mesmo ali, ao segundo número.
Feitos, parcialmente, como os próprios autores confessaram, para escandalizar e irritar o burguês, os dois números de Orpheu atingiram plenamente o seu objectivo.
Findo o projecto, o grupo modernista continuou a publicar noutras revistas: Exílio (1916), Centauro (1916), Portugal Futurista (1917), Athena (1924 - 1925) e Presença (1927 - 1940).

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

«Quem sou eu»?

A pergunta é essa: quem é Fernando Pessoa?
Outra pergunta: qual Pessoa?
Terceira pergunta: quantos Pessoas?

sábado, 13 de setembro de 2008

Outono

O Outono aproxima-se, quer a estação do ano, quer o das nossas vidas.


Autumn Of My Life, Bobby Goldsboro

sábado, 6 de setembro de 2008

Reformulação

Este blogue foi construído como uma experiência, a partir de uma espécie de aposta feita pelo autor consigo próprio e, pelo número de visitantes, parece ter cumprido os seus objectivos.
É, pois, chegado o tempo de o encerrar temporariamente, mais que não seja para respirar... já a partir do dia 8 deste mês.
Voltará, possivelmente, a partir de Novembro.
Até lá...

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Ainda os exames nacionais de Matemática

Foi por mera casualidade que fui parar ao sítio da Escola Secundária de Seia e aos resultados dos exames nacionais de Matemática A.
E o que vi é absolutamente fantástico. Quem olhar para os resultados e não perceber o que se passou este ano concluirá facilmente que os professores dos alunos em questão são uns incompetentes ao nível da avaliação e que cometeram injustiças do tamanho das Torres Gémeas. De facto, com excepção de meia dúzia de alunos que, provavelmente, nem somar dois com três sabem, a maior parte subiu, e muito, as suas notas em relação à CIF. Logo na primeira pauta isso é evidente, com casos de 12 - 19, 12 - 18, 14 - 19, e assim sucessivamente.
A quem interessar, podem acessar à página AQUI!

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Balada do 5.º Ano Jurídico

Para todos aqueles que se preparam, com o mesmo entusiasmo de sempre, para iniciar o ensino superior, aqui fica um vídeo de fado, referente a uma das mais tocantes composições do género. É a célebre Balada do 5.º Ano Jurídico, datada de 1988/89, originalmente interpretada pela Toada Coimbrã e da autoria de Rui Lucas, António Vicente e João Paulo Sousa.
A versão aqui apresentada, do grupo de fados de Coimbra Lacrima, diz respeito à Serenata Monumental da Queima das Fitas de 2005. Passam os anos, mas o sentir é o mesmo. Afinal, é só a mais bela época das nossas vidas.

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Exames - Resultados

Quem está a corrigir exames nacionais do 12.º ano assegura:
  1. Os resultados a Português vão ser, claramente, superiores aos da 1.ª fase (a prova da 2.ª era mais fácil e as instruções do GAVE vão no sentido de facilitar, facilitar e voltar a facilitar na correcção);
  2. Pelo contrário, os resultados a Matemática serão inferiores pelos motivos opostos aos do exame de Português.

É só esperar mais alguns dias...

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Exame de Português (2.ª Fase) - Correcção

Grupo I

A

1. Alguns dos imprevistos, ou dificuldades, que a princesa D. Maria Bárbara enfrenta na sua viagem são os seguintes:
  • a chuva, aparentemente caída em abundância e repetidamente ("Voltou a chover..."), e o frio ("... já não chegava o péssimo tempo que faz, esta chuva, este frio...");
  • o clima adverso teve consequências e gerou outras dificuldades, como, por exemplo, a formação de "atoleiros";
  • o meio de transporte utilizado era deficiente e de muito má qualidade, de tal modo que os "eixos" das rodas se partiam e os "raios" se rachavam como "gravetos";
  • a visão que a princesa teve de "... um pardo ajuntamento de homens, alinhados na beira do caminho e atados uns aos outros por cordas...";
  • a visão do "espectáculo de grilhetas", na véspera do seu casamento, em que tudo deveria ser "ledice", deixa-a perturbada ("turbou-se").
2. O excerto transcrito traduz o contraste entre o ambiente de festa, de alegria, de regozijo, de celebração, que deveria caracterizar o casamento da princesa, e uma visão profundamente negativa da realidade que observa, uma realidade brutal e cruel, caracterizada pela situação de escravidão/escravatura a que são sujeitos os homens que vê na beira da estrada e que se dirigem para as obras de edificação do Convento de Mafra.

3. No excerto, existem diversos recursos estilísticos:
  • desde logo, talvez o mais fácil de detectar, a comparação ("... o convento é para si como um sonho sonhado..."), que remete para o facto de o Convento de Mafra ser uma espécie de sonho para a princesa, isto é, não ser uma realidade palpável, concreta, não obstante o facto de o mesmo existir, exclusivamente, por sua causa, dada a promessa feita pelo pai (início da obra);
  • na expressão acima destacada, podemos observar também uma espécie de pleonasmo ou redundância ("sonho sonhado"), com uma expressividade equivalente à da comparação;
  • em terceiro lugar, todo o parágrafo é dominado pela anáfora e pelo paralelismo ("Maria Bárbara não viu, não sabe, não tocou (...) não serviu, não aliviou, não enxugou..."), que, mais uma vez, destacam, por um lado, o facto de a princesa não ter consciência da existência do convento, não ser uma realidade que lhe marque a existência, e, por outro, o imenso sofrimento, a situação de escravidão e as condições desumanas a que estão sujeitos os homens que se dirigem para os trabalhos do convento;
  • por último, destaque para a metáfora ("... uma névoa impalpável..."), que remete para a dificuldade de Maria Bárbara visualizar o convento, de o tornar uma realidade concreta.
4. É possível dividir o texto nos seguintes momentos:
  • Os imprevistos que marcam a viagem da princesa;
  • A visão dos homens na beira da estrada e a sua perturbação, seguida do «episódio» com o oficial;
  • O desinteresse que a princesa demonstra, no 3.º parágrafo, relativamente à construção do convento, uma espécie de sonho impalpável para ela.

B

Relação Baltasar / Blimunda:
  • conhecem-se num auto-de-fé;
  • a relação é, inicialmente, abençoada pela mãe de Blimunda e, posteriormente, «oficializada» pelo padre Bartolomeu de Gusmão;
  • comunicam através do olhar, de gestos simples (o deixar a porta aberta, sinal de aceitação da parte de Blimunda, o sentar-se, o gesto de acender o lume na lareira, o servir da sopa e o acto de comerem pela mesma colher, sinal de aceitação mútua);
  • «casam» com a bênção do padre Bartolomeu de Gusmão, não cumprindo os preceitos religiosos;
  • a perda da virgindade de Blimunda está envolta num ritual de sangue que remete para a iniciação sexual do casal e o juramento de amor;
  • ...

Em suma, estamos perante:

  • uma relação de amor, de cumplicidade, de companheirismo;
  • uma união de livre vontade;
  • uma relação marcada por demonstrações espontâneas de amor espiritual e carnal, caracterizada por diversos jogos eróticos;
  • uma vivência activa e espontânea do amor e da sexualidade;
  • um casal que transgride os códigos estabelecidos: dormem nus, não casam segundo os cânones, entregam-se a carícias e jogos eróticos, não procriam, não olham a lugares, datas ou limites para consumarem o seu desejo;
  • a vivência de um amor instintivo, natural e genuíno, sem regras nem limites.

Todos estes aspectos contrastam com a relação do casal real, marcada pela ausência de amor (tratou-se de um casamento por contrato), pelo excesso de formalismos e de cerimónias, bem como por uma sexualidade encarada com o fim único de procriar, de dar um herdeiro à coroa, isto é, de onde está ausente o amor e o prazer.


Grupo II

. 1 - A
;

. 2 - B;

. 3 - B;

. 4 - C;

. 5 - A;

. 6 - A;

. 7:
  • A - Falso;
  • B - Verdadeiro;
  • C - Falso;
  • D - Verdadeiro;
  • E - Verdadeiro;
  • F - Falso;
  • G - Verdadeiro;
  • H - Verdadeiro;
  • I - Falso;
  • J - Verdadeiro.

terça-feira, 8 de julho de 2008

Exames - Resultados

No espaço de cinco anos, as notas dos exames a Matemática subiram quase cinco valores. Mais: do ano passado para este, a subida foi de cerca de quatro valores... ou seja, no espaço de um ano.
O único comentário que este feito me merece é dar os parabéns aos alunos. Em simultâneo, espero que aqueles que não saibam consultem uma gramática e procurem o significado de IRONIA.








sexta-feira, 4 de julho de 2008

Lição de História: General Costa e Silva


O general Artur da Costa e Silva (1899 - 1969) foi um célebre presidente da República do Brasil entre 1967 e 1969, ano do seu passamento.

Mas o que fez este homem para ser assim «célebre»? Não foi certamente a ditadura, mas as anedotas que em redor da sua figura se construíram. Uma delas dava conta de uma inauguração de um arranha-céus em São Paulo e do espanto do homem pela altura de um determinado elevador. O seu espanto e a sua ignorância eram tais que perguntou: «Quem puxa isto?». Alguém lhe terá respondido: «Um cabo, Sr. Presidente!». «Um cabo?», perguntou, mais estupefacto, o homem. E, perante a confirmação da resposta, terá tido este momento de puro brilhantismo: «Promovam-no a sargento!»

Porém, a mais célebre bananada está relacionada com um discurso da figura, no qual afirmou: «Antes da revolução, o Brasil estava mesmo à beira do abismo. Comigo deu um grande passo em frente!»

Ainda hoje o Brasil não recuperou totalmente desse passo maldito.

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Exame de Português - Correcção

Grupo I

A
1. Na primeira estrofe, o sujeito poético apresenta a Ilha dos Amores como o prémio devido aos marinheiros pelos feitos praticados/cometidos, enquanto na segunda associa a atribuição desse prémio a um percurso de virtude que deve ser seguido por quem o quer alcançar. Na terceira estrofe, o sujeito lírico apresenta os deuses como humanos que cometeram feitos de grande valor e que, por isso, foram premiados com a imortalidade.

2. A "Fama" surge, de facto, associada ao processo de imortalidade dos heróis, pois é através dela que os «varões» ascendem ao «estelante Olimpo», em razão das suas «obras valerosas» e do «trabalho imenso». Por outro lado, a "Fama", considerada no texto uma «trombeta de obras tais», dá a conhecer os feitos praticados pelos heróis («feitos imortais e soberanos»). Além disso, é a "Fama", ainda enquanto «trombeta», que confere imortalidade aos seres humanos atribuindo e perpetuando os seus nomes («Lhe deu no Mundo nomes tão estranhos / De Deuses, Semideuses, Imortais, / Indígetes, Heróicos e de Magnos»).

3. A apóstrofe presente na estrofe 92 é a seguinte: «(...) ó vós que as famas estimais, (...)» - verso 29. Através dela, o sujeito poético dirige-se directamente aos portugueses, chamando-os à atenção para a necessidade de despertarem do «ócio ignavo», isto é, da preguiça, da passividade, da apatia. Só assim lhes será possível alcançar a "Fama" («Se quiserdes no mundo ser tamanhos, / Despertai já do sono do ócio ignavo, / Que o ânimo, de livre, faz escravo.»).

4. Ambas as formas verbais encontram-se no modo imperativo e contribuem para o reforço do apelo iniciado pelo sujeito poético na estrofe 92, apontando a necessidade de os portugueses abandonarem o ócio, a passividade, e recusarem/abrandarem a ambição desmedida e a tirania («E ponde na cobiça um freio duro, / E na ambição também...»). Neste caso, as formas verbais não exprimem, propriamente, uma ordem, como é tradicional naquele modo verbal, mas sobretudo um apelo.


B
O comentário deveria fazer referência a alguns dos seguintes aspectos tratados n'Os Lusíadas:
  • Episódio do Velho do Restelo: a condenação da aventura marítima movida pelo desejo de glória e de imortalidade, pela ambição e pela vaidade; a enumeração das consequências desse aventureirismo (as mortes, os perigos, as tormentas, a destruição da família, a ruína económica do reino...);
  • Considerações pessoais do Poeta: a crítica ao ócio, à cobiça, à tirania, à decadência da Pátria, ao dinheiro - fonte de corrupção e traição -, ao desprezo a que os portugueses votaram as Armas e as Letras, ao luxo e requintes desmedidos e supérfluos, ao parasistismo, etc.

Grupo II

1 - C;

2 - A;

3 - B;

4 - C;

5 - D;

6 - B;

7:

  • 1 - H;
  • 2 - A;
  • 3 - C;
  • 4 - G;
  • 5 - F.

terça-feira, 10 de junho de 2008

O papel da mulher no MEMORIAL


Clicar AQUI para uma ligação a um sítio que contém um estudo muito interessante sobre o papel da mulher na Memorial do Convento, originário do Brasil.

Dia de Camões

Irás ao paço.
Irás pedir que a tença
Seja paga na data combinada.
Este país te mata lentamente
País que tu chamaste e não responde
País que tu nomeias e não nasce.
Em tua perdição se conjuraram
Calúnias desamor inveja ardente
E sempre os inimigos sobejaram
A quem ousou ser mais que a outra gente.
E aqueles que invocaste não te viram
Porque estavam curvados e dobrados
Pela paciência cuja mão de cinza
Tinha apagado os olhos no seu rosto
Irás ao paço irás pacientemente
Pois não te pedem canto mas paciência
Este país te mata lentamente.

Sophia de Mello-Breyner Andresen

sexta-feira, 6 de junho de 2008

Ligação de interesse

Ligação a outro BLOGUE com interesse para alunos de Português.

Roteiro de leitura

Ligação ao sítio da Secundária D. Manuel Martins, de onde foi retirado este roteiro de leitura do Memorial. Para quem quiser rever o conteúdo da obra.

Provas de Aferição

In Antero


Se fosse simplesmente uma «piadola»... mas não, é mesmo verdade. Os professores que vigiaram as provas de aferição tiveram de ler um «textinho» deste tipo aos alunos.
A profundidade de pensamento desta «gentinha» do ME é admirável.
A talhe de foice, uma consideração: se o exame de Português do 12.º ano for do mesmo calibre das provas de aferição de Língua Portuguesa dos 4.º e 6.º anos, ninguém vai ficar retido à disciplina; bem pelo contrário, vamos ter classificações formidáveis.
Vai uma aposta?

terça-feira, 3 de junho de 2008

Pólos estruturadores

A acção de Memorial estrutura-se a partir da construção de três núcleos.

O primeiro desses núcleos refere-se aos DOMINANTES, aqueles que detêm o poder e dele fazem uso em seu proveito pessoal. É constituído pela realeza e pelo clero, mais concretamente o alto clero, que, sucessivamente, nos é retratado em termos caricaturais (por exemplo, a relação sexual entre os monarcas, ou a cena em que é descrita a fuga precipitada de um frade, apanhado, em plena relação sexual, por um marido enganado).

O segundo núcleo diz respeito ao universo dos DOMINADOS, contemplando quer os operários que trabalham na construção do convento de Mafra - cujo trabalho denodado e sacrificado o narrador não se cansa de exaltar e, em simultâneo, condenar, por resultar da vaidade e da megalomania do rei -, quer as sequências em que sãop denunciados a guerra, a fome, a mendicidade, a prostituição, a criminalidade, a opressão, as desigualdades sociais, etc.

O último núcelo contempla as situações ALTERNATIVAS, isto é, a construção do convento e a da passarola, bem como a relação amorosa vivida por Baltasar e Blimunda.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

Linhas de acção

É possível divisar, no Memorial do Convento, quatro linhas de acção.
A acção principal diz respeito à construção do convento de Mafra, uma acção que entrecruza dados históricos e ficcionais e que se situa nas décadas iniciais do século XVIII. A referida edificação resulta da promessa de D. João V feita nesse sentido, caso a rainha concebesse no espaço de um ano.
Paralelamente, encontramos a história de amor vivida por Baltasar e Blimunda, que constitui, frequentemente, o fio condutor da intriga.
Existe ainda a acção respeitante à construção da passarola, produto do sonho do padre Bartolomeu de Gusmão, um homem visionário que morre, louco, em Toledo.
A finalizar temos a acção centrada sobre o povo que edificou o convento e que constitui o verdadeiro herói do romance, esquecido pela História oficial, por isso mesmo objecto de uma tentativa de resgate ao rio do esquecimento por parte do narrador.

Planos da obra

Em Memorial do Convento, existem três planos:
  • o plano da História: neste primeiro plano, o narrador apresenta-nos o Portugal do século XVIII, em pleno período barroco, uma época de excessos e de acentuadas diferenças sociais;
  • o plano da ficção da História: este plano reflecte-se, sobretudo, na importância que o narrador atribui ao povo anónimo, enquanto personagem colectiva, cujo papel sucessivamente a História ignora; mas também está presente no relato da descrição caricatural da relação entre D. João V e D. Maria Ana, ou no voo da passarola;
  • o plano do fantástico: este nível diz respeito, exclusivamente, à relação amorosa entre Baltasar Sete-Sóis e Blimunda Sete-Luas.

domingo, 1 de junho de 2008

quarta-feira, 28 de maio de 2008

Poupar... Poupar... Poupar...

In Público

Crítica

1. IGREJA

  • Crítica às circunstâncias que envolveram o surgimento da promnessa de construção de um convento em Mafra, chegando o narrador, inclusive, a levantar algumas dúvidas acerca da eficácia dessa mesma promessa;
  • Crítica ao fanatismo religioso da rainha;
  • Crítica à vivência postiça da religião, segundo as conveniências e as necessidades de cada um;
  • Crítica à Inquisição, instalada no reino para atender o interesse da Coroa, visando o enriquecimento através dos bens subtraídos aos judeus;
  • Crítica ao poder crescente e à influência que a Igreja exerce na vida da nação e dos seus destinos, manietando o povo e o próprio rei;
  • Crítica ao facto de promover e fomentar as diferenças sociais, pois acima de tudo estão os seus próprios interesses;
  • Crítica à mundividência religiosa, caracterizada pelo obscurantismo, pelo fanatismo, pelas práticas da Inquisição, responsáveis pela morte bárbara, pela destruição do Homem, nomeadamente daqueles que, pelo seu espírito superior e pela sua visão própria do mundo, contrastavam com a mediocridade e a ignorância dos preceitos religiosos da época;
  • Crítica à devassidão, à corrupção (económica e moral) e ao desrespeito pelo celibato dos frades e das freiras, atraídos pelos prazeres mundanos, da carne, esquecidos dos votos que fizeram ao consagrarem-se;
  • Crítica ao poder, à vaidade e à hipocrisia da Igreja, que cala as explorações de que o povo é vítima, fingindo ignorar que passa fome e não tem uma habitação condigna.

2. REI

  • Crítica à prepotência, à megalomania, à vaidade excessiva e à ignorância;
  • crítica ao poder absoluto e arbitrário do rei, que não ouve ninguém, excepto o Santo Ofício, decidindo, contra todas as razões de estado e do bom-senso, as instalações em Mafra de modo a lá caberem 300 frades;
  • crítica à má administração do país e das finanças, ao desperdício de uma oportunidade de ouro para desenvolver o reino, aproveitando as imensas riquezas provenientes dos vários pontos do império;
  • crítica ao investimento avultado na construção do convento;
  • crítica à imitação e à importação de modas do estrangeiro (por exemplo, a cama da rainha veio da Holanda e o infante D. Francisco oferece à cunhada jóias produzidas em França);
  • crítica à exploração e à miséria do povo.

3. SOCIEDADE

  • Crítica ao povo pelo seu atraso e pela sua ignorância, pela acefalia religiosa, pela superstição, pelo fanatismo, pela forma festiva como celebra os autos-de-fé.
  • Crítica às desigualdades sociais.
  • Crítica à desumanidade da guerra, à futilidade das suas causas e ao desprezo a que são votadas as pessoas quando deixam de ter préstimo (é o caso de Baltasar).
  • Crítica aos casamentos de conveniência (por exemplo, o de D. João V e de D. Maria Ana), com resultados nefastos (adultério, falta de amor, filhos bastardos...).
  • Crítica às perseguições políticas, justificadas com razões religiosas, culminando na descrição dos autos-de-fé.

Evolução... ou como o mundo pouco mudou.


Publicada por Francisco, in http://psitasideo.blogspot.com/

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Estudar em demasia faz mesmo muito mal!




Tempo do discurso

.O tempo do discurso é revelado através da forma como o narrador relata os acontecimentos. Ele pode apresentá-los de forma linear, optar por retroceder no tempo em relação ao momento da narrativa em que se encontra ou antecipar situações.

1. Analepses
  • Referência a 1624: a explicação, em parte, da construção do convento como consequência do desejo expresso, nesse ano, pelos franciscanos, de possuírem um convento em Mafra;
  • referência à batalha de Jerez de los Caballeros, em “Outubro do ano passado”;
  • D. Maria Ana Josefa "chegou há mais de dois anos da Áustria para dar infantes à coroa portuguesa...";
  • D. João V é "um homem que ainda não fez vinte e dois anos...";
  • "S. Francisco andava pelo mundo, precisamente há quinhentos anos, em mil duzentos e onze." (esta analepse e a anterior permitem deduzir a data de 1711 como a que marca o início da acção - 1211 + 500 = 1711; D. João V nasceu em 1689 + 22 anos = 1711);
  • a referência ao facto de o primeiro auto-de-fé ter acontecido "dois anos depois de se queimarem pessoas em Lisboa", que remete oara 1709;
  • o regresso da nau de Macau, que partiu "há vinte meses", ainda Sete-Sóis andava na guerra;
  • o nascimento e baptizado da infante Maria Bárbara ou do infante D. Pedro, que morrerá com dois anos;
  • o nascimento do futuro rei D. José em 1714.
2. Prolepses
  • As mortes do sobrinho de Baltasar e do infante D. Pedro;
  • a morte de Álvaro Diogo, que viria a cair de uma parede durante a construção do convento;
  • o prenúncio da morte da filha do Visconde de Mafra para daí a dez anos: "... não vai haver muita música na vida desta criança (...) daqui a dez anos morrerá e será sepultada na igreja de Santo António...";
  • a informação sobre os bastardos que o rei iria gerar, filhos das freiras que seduzia: "... por isso se diverte tanto com as freiras (...) que quando acabar a sua história se hão-de contar por dezenas os filhos assim arranjados...";
  • as referências aos cravos (outrora, nas pontas das varas dos capelães; muito mais tarde, símbolos da revolução do 25 de Abril);
  • a associação entre os possíveis voos da passarola e o facto de os homens irem à lua no século XX;
  • a alusão ao tipo de diversões típicas do séc. XVII;
  • a referência à futura existência de cinema e aviões: "... para vir o cinema ainda faltam duzentos anos, quando houver passarolas a motor, muito custa o tempo a passar...".
3. Sumários
  • "Tornou o padre aos estudos, já bacharel, já licenciado, doutor não tarda.";
  • "Aí está Junho".
4. Elipses
  • alguns períodos em que Baltasar e Blimunda estão em Mafra ou em S. Sebastião da Pedreira;
  • as viagens do padre Bartolomeu de Gusmão ao estrangeiro, nomeadamente à Holanda;
  • o período que o padre passou em Coimbra a estudar;
  • o período de nove anos, correspondente à procura de Baltasar por parte de Blimunda: "Durante nove anos, Blimunda procurou Baltasar. (...) Milhares de léguas andou..."

Tempo da história

As referências cronológicas do romance são escassas ou descortinam-se por dedução.
  • 1711 ‑ D. João V promete “construir um convento de franciscanos na vila de Mafra” se a rainha lhe der um herdeiro.

    1714 ‑ Nasce o infante D. José, futuro rei, filho de D. João V e de D. Maria Ana.

    1717 ‑ Início da construção do Convento de Mafra, que decorrerá até 1730 (para agradecer o nascimento de D. José).

    1723 ‑ Surto de febre amarela em Lisboa.

    1724 (19 de Novembro) ‑ Furacão em Lisboa.

    1725 ‑ Os casamentos dos príncipes e das princesas está já a ser preparados.

    1728 ‑ D. João V expressa o desejo de inaugurar o convento no dia do seu 41.º aniversário.

    1729 ‑ Casamento dos príncipes portugueses (D. José e D. Maria Bárbara) com os príncipes espanhóis (Fernando e D. Maria Vitória de Bourbon).

    1730 ‑ Sagração da basílica do convento.
    1730 ‑ Desaparecimento de Baltasar.

    1739 ‑ Blimunda procura Baltasar durante nove anos.
    1739 ‑ Auto-de-fé (18 de Outubro), no qual são queimados Baltasar e António José da Silva.

domingo, 25 de maio de 2008

Tempo histórico

1. Dados históricos

  • o título realça o desejo de recordar, remetendo para um passado que é o da construção do convento;
  • os planos da construção do convento e da construção e voo da passarola estão relacionados com a realidade histórica;
  • diversos acontecimentos históricos são abordados no romance:
    -» as referências ligadas ao convento de Mafra respeitam os anos, os dias e até as horas (por exemplo, a colocação e bênção da primeira pedra, cujas cerimónias tiveram início às 7 horas da manhã do dia 17 de Novembro de 1717, o que corresponde, efectivamente, à verdade);
    -» a batalha de Jerez de los Caballeros, que enquadra o aparecimento de Baltasar;
    -» a promessa do rei, por volta de 1711, que deu origem à construção do convento;
    -» a bênção da primeira pedra do convento;
    -» a indecisão do rei acerca do número de frades que o convento albergaria;
    -» a procissão do Corpo de Deus;
    -» a sagração do convento;
    -» a importação de materiais, artistas e obras de arte de vários países da Europa e do Brasil;
    -» o desejo do rei que a cerimónia de sagração ocorresse no 41.º aniversário do seu nascimento – 22 de Outubro de 1730;
    -» o apressar dos trabalhos para que os prazos fossem efectivamente cumpridos;
    -» o recrutamento em larga escala de trabalhadores para a obra;
    -» os custos elevados da obra e a dificuldade de os calcular;
    -» a origem das pedras de Pêro Pinheiro;
    -» as remessas de ouro do Brasil;
    -» os conflitos no Brasil;
    -» os ataques franceses às embarcações portuguesas;
    -» a chegada da nau de Macau;
    -» a elevação do inquisidor a cardeal;
    -» a epidemia em Lisboa;
    -» a morte do infante D. Miguel;
    -» o casamento dos infantes portugueses e espanhóis;
  • personagens históricas: o rei D. João V, a rainha D. Maria Ana, os infantes, membros do clero nomeados, Bartolomeu de Gusmão, Ludovice e Domenico Scarlatti são personagens históricas.

2. Dados ficcionados

O narrador assume que o seu relato é alternativo à História oficial, porque conta aquilo que outros omitiram e que foi esquecido. Consciente da imortalização que acontece sempre que a História é escrita, o narrador tenta imortalizar o maior número possível de pessoas esquecidas pelo discurso oficial.
Assim, quando descreve os homens que foram a Pêro Pinheiro buscar a pedra que ficará sobre o pórtico da igreja, refere o maior número de nomes próprios na tentativa de os imortalizar, já que é esse o seu objectivo: “… tudo quanto é nome de homem vai aqui (…), deixemos os nomes escritos, é essa a nossa obrigação, só para isso escrevemos, torná-los imortais, pois aí ficam, se de nós depende, Alcino, Brás, Cristóvão, Daniel, Egas, Firmino, Geraldo, Horácio, Isidro, Juvino, Luís, Marcolino, Nicanor, Onofre, Paulo, Quitério, Rufino, Sebastião, Tadeu, Ubaldo, Valério, Xavier, Zacarias, uma letra de cada um para ficarem todos representados…”.
Mas outros factos históricos sofrem alterações ou não correspondem exactamente à História. Bartolomeu de Gusmão é uma das personagens em que a correspondência entre a História e a ficção é apenas parcial, como se nota até no nome da personagem, que na obra aparece como Bartolomeu Lourenço e só mais tarde de Gusmão. As notícias mais ou menos nebulosas acerca das suas experiências voadoras são aqui amplamente desenvolvidas e chegam, por momentos, a tornar-se o centro do romance. A própria conversão de Bartolomeu de Gusmão ao judaísmo é já aqui preparada, quando da apresentação das suas reflexões acerca da unidade ou trindade divina. Também a fuga à Inquisição para Espanha e a sua morte nesse país são relatadas no romance com mais ou menos ingredientes ficcionais.
A figura de D. João V e do seu reinado sofrem igualmente adaptações várias, mas mais ligadas ao processo da ironia e ao comentário de uma voz anacrónica do que a alterações históricas consideráveis.
A Inquisição e as suas práticas, os eventos populares e religiosos e o casamento dos infantes de Portugal e Castela servem mais para recriar a ambiência de uma época, sobre a qual o narrador tece comentários vários, sobretudo críticos, do que para adensar a intriga.

sábado, 24 de maio de 2008

Simbolismo

1. Números

  • Sete

Este número surge inúmeras vezes no romance: a data e a hora de sagração do convento (7 da manhã de 17 de Novembro de 1717), os setes anos de permanência de Scarlatti em Portugal, as sete vezes que Blimunda passa por Lisboa à procura de Baltasar, as sete igrejas visitadas por alturas da Páscoa, os sete bispos que baptizaram a infanta Maria Xavier Francisca comparados a sete-sóis de ouro e prata nos degraus do altar-mor, os nomes Sete-Sóis e Sete-Luas.
O sete representa a totalidade do universo em movimento e é o somatório dos quatro pontos cardeais com a trindade divina.
A sua presença nos nomes de Baltasar e de Blimunda liga-se à mudança de um ciclo e à renovação positiva, cujo resultado será a construção da passarola. De facto, o par amoroso simboliza a harmonia cosmogónica (o dia e a noite) e a sua união perfeita representa o acesso a um outro pode, que simboliza a Totalidade.

  • Nove

Este número representa a insistência e a determinação de Blimunda em procurar o homem amado (de facto, procurou-o durante nove anos) e a intemporalidade do tempo da busca. A deusa grega Deméter também percorreu o mundo inteiro durante nove dias em busca da filha Perséfone, quando esta foi raptada. O nove está também ligado à gestação, à renovação e ao renascimento. Ele parece ser a medida das gestações, das buscas frutíferas e simboliza o coroamento dos esforços, o concluir de uma criação. De facto, passados os longos nove anos da sua busca, Blimunda reencontra finalmente Baltasar, tratando-se agora não de um encontro físico, mas de uma comunhão mística, e, por isso, total e completa.

2. Personagens

  • Baltasar

Baltasar, soldado acabado de regressar da guerra, apresenta uma deformidade física que o torna uma personagem diferente da maioria e une-o a Blimunda, também ela diferente, pela sua capacidade de ver por dentro das pessoas. A perda da mão esquerda associa-o a um universo saturnino (negativo, pela ideia de paralisação) e infernal, do qual só sairá após a conclusão do seu percurso ascensional, conquistando, através do voo da passarola, a assunção da sua identidade. A sua condição de homem simples e pragmático,aliada à incapacidade intrínseca de questionar os dogmas estabelecidos, faz dele aquele que cria a passarola. Neste sentido, Baltasar, qual Ícaro, aproxima-se demasiado do Sol e, por isso, sofre um castigo: a morte na fogueira.
Por outro lado, Baltasar constitui um elo de ligação entre o universo simbólico e o universo judaico-cristão, pois participa na criação da passarola e na construção do convento, e, igualmente, funciona como elemento catalisador da loucura do padre Bartolomeu de Gusmão e da aceitação tácita de Blimunda. A sua relação é baseada no silêncio, no consentimento mútuo e implícito de ambos numa vida em comum, isto é, uma relação de completude que os torna imunes ao meio que os rodeia, defende-os de superstições, fortalece-os contra medos e temores.
Além disso, simbolizam a dualidade cíclica que, harmonicamente, realiza a cosmogonia universal (o dia e a noite) e representam o andrógino original, isto é, a congregação dos opostos, a totalidade e a perfeição espiritual. É o que ressalta dos nomes, a complementaridade Sol/Lua, dia/noite, luz/sombra, que simboliza a alternância do mundo, a união dos opostos, nomeadamente, o universo divino e o universo humano.
O casamento das duas ideias – Sol e Lua – simboliza a união do princípio masculino com o princípio feminino. Por outro lado, estes nomes, associados ao número sete, simbolizam, além da complementaridade, a perfeição.

  • A mutilação de Baltasar

A mutilação coloca a personagem fora do tempo, ou seja, num nível de actuação diferente, onde irá lutar para obter a sua reintegração no tempo por uma nova utilização das mãos, o que acaba por acontecer com a construção da passarola e com a colaboração na edificação do convento de Mafra. Por outro lado, este defeito físico coloca-nos perante uma personagem que foge ao conceito tradicional de herói do romance.
Aliás, os mutilados são uma presença forte no Memorial, pois o narrador chega a salientar a quantidade de homens mutilados e aleijados, física e psicologicamente, envolvidos na edificação do convento (pp. 242-243).

  • Padre Bartolomeu de Gusmão

O padre Bartolomeu de Gusmão representa, simbolicamente, um ser fragmentário, dividido entre a religião e a alquimia, vivebdo um conflito interior motivado pela contínua procura de um saber que o conduzirá à subversão dos dogmas religiosos e, posteriormente, à loucura e à morte.
Esta personagem representa o mito de Prometeu e a passarola, a obra de uma vida, representa o pensamento dialéctico, pois congrega o princípio de um barco e o da ave que voa. A busca incessante do “meio” que fará voar a passarola leva-o a enveredar pelo estudo das antigas teorias medievais da física, unindo-as às novas descobertas científicas que impregnam a Europa.

  • Scarlatti

Esta personagem simboliza o transcendente que advém da música e que, ligado aos poderes de Blimunda, instaura o domínio do maravilhoso no romance.
Duplo especular do padre Bartolomeu de Lourenço, Scarlatti simboliza a ascensão do homem através da música, numa clara união entre a acção e o pensamento. Pela sensibilidade criadora e pela técnica de execução, Scarlatti liga-se ao mito de Orfeu e contribui para a criação do universo encantatório que cura Blimunda. Com efeito, ele partilhará o sonho do trio e morrerá. Metaforicamente, após o voo da passarola, uma vez que destrói o cravo que o ligava explicitamente à trindade construtora e, implicitamente, ao interdito, isto é, ao sonho de voar.

3. Outros símbolos

  • Sol

O Sol percorre um ciclo celeste diurno de Oriente para Ocidente – assim Baltasar percorrer, no interior da passarola, um ciclo entre Lisboa e Monte Junto; e tal como o sol, para nascer, segundo a antiga mitologia, tem de vencer todos os dias todos os guardiães da noite/morte, assim Baltasar terá que vencer os guardiães da «noite histórica»: a Inquisição, a credulidade popular, as forças espirituais retrógradas da Escolástica. E assim como o sol atravessa o céu, mas nele não se detém nem o conquista definitivamente para si, assim Baltasar atravessa o céu, rompe os céus, rasga a imagem pura de um céu morada de Deus. Neste aspecto, Baltasar, sob as ordens científicas do padre Bartolomeu de Gusmão, assume o estatuto de herói mítico que ousa desafiar a estabilidade aparentemente eterna da ideologia cristã. E para que o simbolismo clássico do herói maravilhoso e trágico que ousa desafiar os deuses seja cumprido na totalidade, Baltasar morre pelo fogo, como herético, o padre Bartolomeu de Gusmão morre louco, em Toledo, e Blimunda vagueia pelo mundo sem destino.

  • Lua

A lua, porque não tem luz própria, é o princípio passivo do sol. Porém, no Memorial do Convento, o narrador atribui a Blimunda capacidades intuitivas e ecovisionárias, dependentes das fases da lua, que a tornam, como elemento activo, tão importante quanto Baltasar. Blimunda não se compreende sem Baltasar e vice-versa, constituindo um par antitético mas intimamente complementar de dia-noite, claro-escuro, Sol-Lua. Baltasar e Blimunda têm o mesmo nível de protagonismo no romance, não sendo nenhum deles superior ao outro. Esta subversão do estatuto social feminino no século XVIII, passivo e submisso face ao poder masculino, é subsidiária do modo de vida a dois do casal, sem casamento oficial e com igualdade de mando e obediência entre ambos.
Por outro lado, a lua, devido às suas fases, que condicionam o poder de Blimunda, é também símbolo do ritmo biológico da Terra, é medida do tempo, frutificadora da vida, guardadora da morte, dispensadora de geração.

  • Passarola

Concebida como uma “barca voadora”, a passarola simboliza o elo de ligação entre o Céu e a Terra. Ela reúne dois símbolos que se opõem: a barca e a ave. No entanto, como a barca remete para a viagem e a ave para a liberdade, a passarola, pelo seu movimento ascensional, representa metaforicamente a alma humana que ascende aos céus, numa ânsia de realização que a liberta do universo canónico e dogmático dos homens.
Assim, a passarola simboliza o sonho, a libertação do espírito e a passagem a um outro estado de existência.

  • O voo da passarola

O acto de voar aparece como uma conquista do progresso e da ciência, como prelúdio do que mais tarde se chamará «aviação». O acto de voar sintetiza, assim, a vitória da razão sobre a crença religiosa e, consequentemente, no triunfo de um futuro libertado sobre um passado considerado supersticioso e alienante.
Por outro lado, representa o progresso enquanto enquadramento da eterna luta do homem para, época a época, a si próprio se ultrapassar e atingir uma dimensão divina ou quase divina. Baltasar, Blimunda e o padre Bartolomeu de Gusmão repetem o desejo de Faetonte, filho mortal de Apolo, que, querendo imitar o pai, conseguiu deste a promessa de o deixar guiar o carro do sol por um só dia. Porém, Faetonte não conseguiu manobrar os cavalos e sustentar o carro do sol na abóboda celeste e o carro despenhou-se sobre a Terra, incendiando-a e matando o jovem ousado. Do mesmo modo, o padre Bartolomeu de Gusmão e Baltasar morrerão devido ao seu desejo de voar e Blimunda tornar-se-á em mulher errante.

  • Vontades recolhidas por Baltasar

As vontades recolhidas por Blimunda, necessárias para fazer erguer a passarola e metaforizadas nas nuvens fechadas que se situam na boca do estômago, são as vontades humanas que, ao longo de séculos, coincidiram e fizeram o progresso do mundo.

  • O olhar de Blimunda em jejum

O olhar de Blimunda em jejum permite-lhe conhecer eficazmente a alma, o interior e o invisível. Simbolicamente, o olhar possui um poder mágico e é o instrumento de ordens interiores: mata, fascina, fulmina, seduz do mesmo modo que exprime.

Linguagem e Estilo

1. Figuras de estilo

  • Ironia: a visão crítica dos acontecimentos do narrador é, geralmente, suportada pela ironia (relação rei/rainha, determinados actos religiosos, autos-de-fé, etc.).
  • Metáfora: "(...) esta cidade, mais que todas, é uma boca que mastiga..." (p. 27).
  • Hipálage: "(...) a regalar a vista sôfrega nas grandes peças de carne..." (p. 42).

2. Registos de língua

  • Língua popular e familiar, geralmente com função crítica e irónica ou como forma de explicitação da classe social das personagens: "emprenhar" (p. 11), "vossemecê" (p. 40);
  • Calão: "puta", "merda".

3. Verbo

  • Uso do presente do indicativo (p. 39):transporta o leitor para o tempo da narrativa;
  • Modo imperativo, relembrando a oratória barroca - Padre António Vieira (p. 308);
  • Gerúndio.

4. Construção frásica

  • frases longas que, por um lado, aproximam o texto do discurso oral e, por outro, traduzem o monólogo interior e a celeridade do pensamento (pp. 94, 131);
  • paralelismo de construção (p. 26);
  • ausência de sinais gráficos indicadores de diálogo, sendo a vírgula que separa as falas das personagens;
  • ausência dos pontos de exclamação e de interrogação;
  • paralelismo de construção (p. 26);
  • enumeração (p. 335);
  • hibridismo de tipologias discursivas: utilização do discurso directo, indirecto e indirecto livre, sem recurso, porém, aos tradicionais sinais gráficos (dois pontos, seguidos de travessão) e lexicais (verbos introdutores do discurso como “perguntar”, “declarar”, “dizer”, “afirmar”, etc.);
  • polissíndeto (pp. 99, 112-113).

5. Oposições sugeridas por vocábulos antónimos para sugerir as diferenças entre ricos e pobres (p. 27).

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Narrador - Focalização

1. Focalização interna

A predominância da focalização interna significa que, na obra literária, se instaura o ponto de vista de uma das personagens que vive a história.
No Memorial do Convento, existe focalização interna quando, por exemplo, Sebastiana de Jesus nos relata os acontecimentos (pp. 52-53), o mesmo sucedendo com Baltasar (p. 217).


2. Focalização interventiva

Esta focalização funciona como uma espécie de comentário, aliado à adesão ou rejeição de comportamentos ou formas de estar das personagens, apresentando, geralmente, uma função ideológica.
Assim, existe focalização interventiva quando o narrador tece comentários com carácter valorativo a propósito dos eventos narrados (p.123-124); quando os comentários do narrador reflectem a voz do povo, assumindo o seu registo de língua (pp. 31, 229); quando recorre a aforismos (pp. 27, 268, 287, 298, 306, 325, 346) e quando as intervenções surgem como prolepses, antecipando acontecimentos futuros (pp. 213-214).


3. Focalização omnisciente

A omnisciência do narrador significa que este tem um conhecimento total dos acontecimentos e fornece, sobre eles, os dados fundamentais para que a intriga possua coerência. No fundo, o narrador instaura-se como um deus que tudo sabe, vê e ouve, tendo acesso, inclusive, aos pensamentos das personagens.
Neste romance, o narrador possui um saber que implica não só a transcendência em relação a todas as personagens como uma perspectiva tridimensional do tempo – presente, passado e futuro – a que está subjacente uma visão integrada dos acontecimentos e a inscrição dos fenómenos narrados numa determinada cultura, transversal a um conhecimento global da História. É este conhecimento que permite ao narrador seguir eventos ocorridos em tempos diferentes, estando presente ao nível do tempo da história (século XVIII) e, simultaneamente, num tempo posterior, o do discurso ou da enunciação.

Narrador - Presença

O narrador de Memorial do Convento é, geralmente, heterodiegético, ou seja, é uma entidade exterior à história que assume a função de relatar os acontecimentos. Surge normalmente na terceira pessoa (visível nos pronomes e verbos na terceira pessoa), ainda que, por vezes, ocorra a primeira pessoa do singular e do plural, identificando-se, então, com as outras personagens: “(…) na grande entrada de onze mil homens que fizemos em Outubro do ano passado e que se terminou com perda de duzentos nossos (…) A Olivença nos recolhemos, com algum saque que tomámos em Barcarrota e pouco gosto para gozar dele (…)” – p. 35. Neste excerto, encontramos um narrador homodiegético, um narrador que é uma personagem da história, que revela as suas próprias vivências, que se insere na diegese e que, em determinada situação, reivindica o relato dos acontecimentos que viveu.

Por vezes, a voz do narrador heterodiegético confunde-se com o pensamento de outra personagem: “Veio andando devagar. Não tem ninguém à sua espera em Lisboa, e em Mafra, donde partiu anos atrás para assentar praça na infantaria de sua majestade, se pai e mãe se lembram dele, julgam-no vivo porque não têm notícias der que esteja morto, ou morto porque as não têm de que seja vivo. Enfim, tudo acabará por saber-se com o tempo.” (p. 36).
Noutros momentos, encontramos a união entre a voz do narrador e a de outra(s) personagem(ns) em substituição do discurso directo: “Num canto da abegoaria desenrolaram a enxerga e a esteira, aos pés delas encostaram o escano, fronteira a arca, como os limites de um novo território, raia traçada no chão e em panos levantada, suspensos estes de um arame, para que isto seja de facto uma casa e nela possamos encontrar-nos sós quando estivermos sozinhos.” (p. 90).

quinta-feira, 22 de maio de 2008

Espaço psicológico

1. Os sonhos:

  • os sonhos do rei de da rainha contrastam com os das outras personagens, sobretudo porque evidenciam o desamor que marca a relação do casal real: D. João V sonha com a sua própria imortalidade, com a descendência e com o convento, enquanto D. Maria Ana sonha com o cunhado;
  • Baltasar sonha com Blimunda, com o trabalho, com os animais, a terra, o ar;
  • Baltasar e Blimunda têm sonhos comuns e, por vezes, sonham em conjunto com o padre Bartolomeu de Gusmão, nomeadamente no que diz respeito à passarola, o que evidencia o profundo envolvimento das três personagens na realização daquela obra, ao contrário da construção do convento, executada à custa do trabalho de milhares para a realização do sonho de um só - D. João V.

2. Os pensamentos:

  • os pensamentos das personagens revelam o seu mundo interior, os seus desejos, sonhos e ambições.

3. A atmosfera do romance

  • A atmosfera do romance é densa e pesada, em virtude da religiosidade opressiva, com traços de fanatismo, imposta pelos clérigos e pelas ordens religiosas que manobram a vida dos lisboetas, os habitantes da corte, os operários que trabalham nas obras do Convento de Mafra. Tudo parece girar em função da motivação religiosa: desde o nascimento da herdeira real, resultado de uma promessa, à construção do convento. A própria rainha vive dominada pelo fanatismo religioso.
  • Por outro lado, à excepção das touradas, todos os divertimentos e acontecimentos importantes ou são de cariz religioso, ou têm a ver com a Igreja, ou misturam o religioso e o profano (como os festejos que antecedem a procissão do Corpo de Deus), ou ainda a religião e a luxúria (por exemplo, a procissão da penitência e as saídas das mulheres para visitar as igrejas durante a Quaresma). Pairando sobre tudo isto está sempre a mancha negra da Inquisição e os autos-de-fé, para gáudio e elevação espiritual de nobres e plebeus.
  • O sermão proclamado aquando do transporte da pedra e após a morte de Francisco Marques representa a demagogia exercida pelo clero sobre o povo ignorante.
  • O lar de Marta Maria e João Francisco distinguem-se desta imagem profundamente negativa da sociedade portuguesa, pela tolerância com que recebem o filho e a nora, que suspeitam não estar casados conforme mandam as leis da Igreja -, não questionando algumas estranhezas que notam em Blimunda, embora essa tolerância não seja tão grande que a aceitassem se ela fosse uma cristã-nova.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Espaço social

1. Paço:


  • A subserviência e o vazio dos gestos repetidos e inúteis por parte do enxame de cortesãos que rodeiam o rei e a rainha.

2. Entrudo e Quaresma:

  • A religião como pretexto para a prática de excessos (satisfação dos prazeres carnais) e brincadeiras carnavalescas (as pessoas comem e bebem em demasia, dão "umbigadas pelas esquinas", atiram água à cara umas das outras, batem nos mais desprevenidos, tocam gaitas, espojam-se nas ruas...);
  • A penitência física e a morificação da alma após o desregramento durante o Entrudo (é tempo de "mortificar a alma para que o corpo finja arrepender-se...");
  • As manifestações de fé caracterizadas pela histeria (as pessoas arranham-se, arrastam-se pelo chão, puxam os cabelos, esbofeteiam-se, autoflagelam-se);
  • A sensualidade e o mistcismo.

3. Histórias de milagres e de crimes:

  • A superstição e a crendice;
  • A superficialidade;
  • A libertinagem.

4. Autos-de-fé:

  • A repressão religiosa e política;
  • O fanatismo;
  • O carácter sanguinário das diversas classes (o celebrar e festejar a morte);
  • A procura de emoções fortes que preencham o vazio da existência;
  • A futilidade, a vaidade e os jogos de sedução femininos (a preocupação com as toilettes, os sinaizinhos no rosto, as borbulhas encobertas...).

5. Baptizados e funerais régios:

  • O luxo e a ostentação;
  • A vida e a morte como espectáculos.

6. Elevação a cardeal do inquisidor D. Nuno da Cunha:

  • O luxo e a ostentação.

7. Vida conventual:

  • A libertinagem e a devassidão;
  • O desrespeito pelas normas religiosas.

8. Touradas:

  • O sangue a morte como espectáculo e divertimento (a tortura dos touros, o sangue, as feridas, as "tripas").

9. Procissão do Corpo de Deus:

  • O luxo e a ostentação;
  • A sobreposição do profano ao sagrado;
  • A libertinagem e a vida dissoluta do rei;
  • A histeria e o fanatismo (as pessoas batem em si próprias e aos outros).

10. Cortejo de casamento:

  • O casamento da realeza;
  • A vida feminina;
  • O luxo e a ostentação desmedidos;
  • O contraste desse luxo com a fome e a miséria do povo, que luta pela sobrevivência e se entrega a comportamentos imorais;
  • O estado deplorável dos caminhos.

11. Trabalho no convento:

  • A servidão e a escravidão populares (os homens são obrigados, na maioria dos casos, à força de armas, ou voluntariamente, na mira de um salário e de alimentação certa, a abandonar as suas casas e a construir o convento, vivendo em barracões, executando um trabalho desmedido e roídos por doenças venéreas).

Em suma, Lisboa é representada como um espaço infecto, alimentado pelo ódio (aos judeus e aos cristãos-novos), pela corrupção moral eclesiástica, pelo poder repressivo e hipócrita do Santo Ofício e pelo poder autocrático do rei.

Espaço físico / geográfico

A acção de Memorial do Convento desenrola-se em dois grandes espaços: Lisboa e Mafra, a que se acrescenta o Alentejo, em circunstâncias bem específicas.

Lisboa é um macroespaço caracterizado, genericamente, como uma cidade muralhada e com abundância de igrejas ("Lisboa derramava-se para fora das muralhas. Via-se o castelo lá no alto, as torres das igrejas dominando a confusão das casas baixas, a massa indistinta das empenas." - p. 40), o que denuncia o ambiente profundamente religioso e beato que a domina. Por dentro, é descrita como uma cidade suja ["(...) a cidade é imunda, alcatifada de excrementos, de lixo, de cães lazarentos e gatos vadios, e lama mesmo quando não chove." - p. 28].

Enquanto macroespaço, integra outros espaços:
  • Mercado de peixe, espaço contrastante com a visão imunda da cidade ("Sete-Sóis atravessou o mercado de peixe. (...) Mas no meio da multidão suja, eram miraculosamente asseadas, como se as não tocasse sequer o cheiro do peixe que removiam às mãos cheias..." - p. 42).

  • Paço: trata-se de um espaço de que não há grandes descrições, ressaltando apenas as atitudes das personagens que o habitam e os factos que lá têm lugar.

  • Terreiro do Paço: local onde Baltasar trabalha num açougue, após a sua chegada a Lisboa (p. 71).

  • Rossio: local onde decorrem os autos-de-fé.

  • S. Sebastião da Pedreira: espaço relacionado com a passarola e ao seu carácter mítico (pp. 65 - 67). Na época, era um espaço rural, onde existiam várias quintas que integravam palacetes.

  • Abegoaria: constitui o ninho de amor de Baltasar e Blimunda. Da descrição que o narrador dela faz, podemos inferir a simplicidade da vida e a pobreza do casal ("Num canto da abegoaria desenrolaram a enxerga e a esteira, aos pés dela encostaram o escano, fronteira a arca, como os limites de um novo território, raia traçada no chão e em panos levantada, suspensos estes por um arame para que isto seja de facto uma casa..." - p. 88). Por outro lado, aí se vai construindo a passarola.

O outro espaço é o de Mafra, o segundo macroespaço (pp. 110 - 111), pouco descrito. É aí que milhares de homens, em condições infra-humanas, vão construindo, ao longo de décadas, o convento, muitos deles perdendo lá a própria vida ("... o abençoado há-de ir a Mafra também, trabalhará nas obras do convento real e ali morrerá por cair de parede, ou da peste que o tomou, ou da facada que lhe deram, ou esmagado pela estátua de S. Bruno..." - p. 117). Nesta vila, destaca-se outro espaço: o alto da Vela, local escolhido por D. João V para edificar o convento e que deu lugar à chamada vila nova, à volta do edifício. Nas imediações da obra, surge a Ilha da Madeira, onde começaram por se alojar dez mil trabalhadores, ascendendo, posteriormente, a quarenta mil.

Um terceiro espaço é o Alentejo, um lugar povoado por medigos e salteadores. Esta zona do reino é percorrida por Baltasar aquando do seu regresso da Guerra da Sucessão e, mais tarde, pelo cortejo real, que vai de Lisboa a Elvas, por ocasião do casamento dos príncipes D. Maria Bárbara e D. José com os príncipes espanhóis. Nestas ocasiões, realçam-se a miséria e a penúria de quem aí habita, bem como os caminhos de lama e de pobreza.

Outros locais a considerar são Pêro Pinheiro, local de onde é originária a pedra, e a Serra do Barregudo, lugar onde a passarola pousou e esteve escondida e donde partiu para a derradeira e fatal viagem de Baltasar.