segunda-feira, 24 de março de 2008

10.4.4. Plano das Consideraçõe Pessoais do Poeta

Este plano é aquele em que Camões tece comentários, muitas vezes satíricos, sobre matérias diversas, normalmente no início e fim dos cantos:

  • a fragilidade da vida humana face aos perigos do mar e da terra (I, 105-106);
  • o desprezo a que os portugueses votaram as Artes e as Letras (V, 91-100);
  • o valor da glória e das honras por mérito próprio (VI, 95-99);
  • crítica aos povos que não seguem o exemplo português (VII, 2-14);
  • a ingratidão de que se sente vítima por parte da sociedade (VII, 78-87);
  • lamento face à importância dada ao dinheiro, fonte de corrupção e traição (VII, 96-99);
  • os modos de atingir a imortalidade, condenando a cobiça, a ambição e a tirania (IX, 92-95);
  • a decadência da pátria (X, 145);
  • a invectiva a D. Sebastião a tomar medidas no sentido de corrigir e repor o país na senda do êxito (X, 146-156).

10.4.3. Plano da Mitologia

Formalmente, a unidade de Os Lusíadas é estabelecida pela intriga dos deuses, visto que estes estão em cena desde o princípio até ao fim da obra (excepto na introdução e na conclusão): abre com o episódio do Consílio dos Deuses e termina com o da Ilha dos Amores. As personagens mitológicas têm uma vida que falta às personagens históricas: são aquelas os verdadeiros seres humanos, que sentem, se apaixonam, intrigam. Vasco da Gama é muito mais hirto e frio que o Adamastor, não obstante este ser um cabo. E ninguém tem a presença, a força, a personalidade provocante de Vénus.

A acção consiste no seguinte: Vénus, auxiliada por Marte, seu amante, pretende ajudar os portugueses a chegarem à Índia; Baco, que entende que o Oriente é domínio seu, opõe-se-lhe, provocando a animosidade dos povos costeiros, convencendo ainda os deuses marítimos a desencadearem uma tempestade e, finalmente, induzindo os mouros a atacarem Vasco da Gama. Mas Vénus, vigilante, intervém junto de Júpiter, mobiliza as ninfas do mar, que impelem as naus para fora do perigo, e, seduzindo os deuses do mar, consegue aplacar a tempestade. Finalmente, para premiar os portugueses, prepara-lhes, com a ajuda de seu filho Cupido, uma ilha de delícias, onde eles, conubiando-se com as ninfas, se tornam divinos e são admitidos à visão do cosmos com Vasco da Gama à frente, ele próprio tornando-se esposo da deusa do mar.
Assim, é na intriga dos deuses que radica a verdadeira acção com princípio, meio e fim.

Através da mitologia, Camões exprime algumas tendências do Renascimento:
  • a vitória dos homens sobre os deuses, que personificam os limites impostos pela tradição à iniciativa humana;
  • a confiança na capacidade humana para dominar a natureza;
  • a concepção da natureza como ser vivo;
  • a afirmação (virtual) de Deus como imanência;
  • a crença na bondade da natureza;
  • a identificação da lei da razão com a lei da liberdade;
  • a destruição da noção de pecado.

    N’ Os Lusíadas, existem vários tipos de mitologia:
    pagã: os deuses pagãos greco-romanos;
    cristã: Deus;
    mista: coexistência das duas anteriores;
    céltica/mágica: fadas, bruxas, feiticeiras.

10.4.2. Plano da História de Portugal

A História de Portugal, exposta em discursos (de Vasco da Gama ao rei de Melinde e de Paulo da Gama ao Catual, para a história passada em relação à viagem – 1498) e em profecias (de Júpiter, do Adamastor, da ninfa Sirena e de Tétis, em relação à historia futura no que diz respeito à viagem), não tem uma unidade intrínseca.
Uma parte dessa história é dada em sequência cronológica e consta do discurso de Vasco da Gama ao rei de Melinde. Outra parte é dada em quadros soltos, como são as pinturas (“bandeiras”) que Paulo da Gama explica ao Catual, ou as profecias.
Esta sensação de descontinuidade é agravada pelo facto de os feitos serem, na maior parte, proezas individuais de guerreiros, faltando um ser colectivo de que os indivíduos sejam formas transitórias (cf. Fernão Lopes, Crónica de D. João I). O “peito ilustre lusitano” é uma abstracção incapaz de encarnar as proezas sucessivas dos guerreiros. Há alguns belos momentos (a batalha do Salado, a fala da Formosíssima Maria, a batalha de Aljubarrota, o episódio de Inês de Castro, as sínteses de Tétis), mas são conjuntos soltos, contíguos a outros momentos. Não se vê formar-se uma nação, e a ideia de pátria resulta uma noção abstracta: está nos sentimentos do poeta e não nos factos que narra. Não existe uma acção de conjunto nem heróis, que se encontram reduzidos a puras abstracções. Afonso Henriques, Nuno Alvares Pereira, D. João I, Duarte Pacheco, D. Fuas Roupinho ou Geraldo Sem Pavor não têm caracterização própria, não são personalidades diferenciadas, como são, por exemplo, Aquiles e Ulisses, heróis da Ilíada e da Odisseia.
Por outro lado, a sequência das batalhas e dos guerreiros, passados ou futuros, é dada em discursos e obedece às regras da oratória: ora é uma sequência cronológica (Vasco da Gama), ora uma selecção de profecias (Júpiter, no canto II, para consolar Vénus, prevê alguns triunfos; no canto V, Adamastor antecipa alguns casos trágicos como castigo pelo atrevimentos dos portugueses; no canto IX, Tétis profetiza as guerras no Oriente).
Ora, em certo sentido, a oratória é o contrário da epopeia. Na oratória, só tem vida própria o orador, personagem única, em face do público; na epopeia, pelo contrário, como no romance, o autor despersonaliza-se em benefício das personagens, sendo nestas que reside a vida.
Desta forma, a narração da Historia de Portugal e dos feitos dos portugueses é caracterizada pela ausência de uma acção de conjunto; são quadros que se sucedem cronologicamente, mas que não revelam uma ideia de conjunto.

O plano da História de Portugal que a obra apresenta é o seguinte:
  • Em Melinde, Vasco da Gama narra ao rei os acontecimentos de toda a nossa história, desde Viriato ao reinado de D. Manuel I;
  • Em Calecut, Paulo da Gama apresenta ao Catual episódios e personagens representados nas bandeiras;
  • A história posterior à viagem é narrada através de profecias:
    - Júpiter profetiza “feitos ilustres” no Oriente e vitórias tão retumbantes que causarão inveja a Marte (II, 44-45);
    - o sonho profético de D. Manuel: dois velhos (rios Indo e Ganges) vaticinam a chegada à Índia por mar no seu reinado (IV, 66-75);
    - Adamastor profetiza “ventos e tormentas desmedidas”, “naufrágios e perdições” para a gente que profanou o seu mar. Refere-se a D. Francisco de Almeida, por exemplo (V, 42-48);
    - a ninfa Sirena descreve as glórias futuras dos portugueses no Oriente (X, 10-74);
    - Tétis aponta os lugares onde os portugueses hão-de realizar grandes feitos e atingir a imortalidade.

sexta-feira, 21 de março de 2008

10.4.1. Plano da Viagem

O Plano da Viagem é constituído pela narração dos acontecimentos que respeitam à viagem entre Lisboa e a Índia.
Dentre esses acontecimentos, destacam-se os seguintes:
  • narração do percurso da frota portuguesa até Melinde por Camões (cantos I e II);
  • narração da História de Portugal até ao início da viagem, em forma de discurso retrospectivo dirigido ao rei de Melinde e a pedido deste (cantos III, IV e V, estância 85);
  • narração da primeira parte da viagem, desde Belém até à passagem do Cabo da Boa Esperança, local onde, supostamente, se situaria o Adamastor, e do surgimento do escorbuto, também em discurso retrospectivo;
  • narração do último troço da viagem entre Melinde e Calecute (canto VI).

Cronologicamente, a viagem observou as seguintes etapas:

  • partida de Belém a 8 de Julho de 1497 (IV, 84 - ss.);
  • peripécias da viagem;
  • paragem em Melinde por dez dias;
  • chegada a Calecute a 18 de Maio de 1498;
  • regresso a Lisboa a 29 de Agosto de 1498;
  • chegada de Vasco da Gama a Lisboa a 19 de Agosto de 1499 (a nau de Nicolau Coelho tinha chegado dois meses antes).

A viagem não constitui realmente uma acção, nem tem intriga, nem personagens propriamente ditas. Falta-lhe autonomia. Para que a viagem constituísse uma acção, seria necessário que os seus protagonistas se debatessem com as dificuldades e as resolvessem graças às suas forças e engenho. De facto, não vemos Vasco da Gama arriscar-se e agir, molhar-se na água, nem desenredar-se de intrigas, nem manchar-se de sangue (excepto na escaramuça com indígenas no episódio de Veloso, por ele próprio descrita ao rei de Melinde), nem ter uma vontade, um capricho ou uma paixão. Serve apenas para recitar os belos discursos de Camões. O único ensejo que tem de resolver um problema pelos seus próprios meios, isto é, sem a intervenção dos deuses, ocorre quando o Catual o detém em Calecut. Não vemos também Vasco da Gama falar aos seus marinheiros, que, de resto, parecem não existir, são uma abstracção que povoa as naus. Uma única personagem se nos depara, numa visão fugidia: Fernão Veloso, numa atitude nada heróica (em fuga) e num sito típico de fanfarronice peninsular.
Por outro lado, pode dizer-se que a viagem não tem história nem enredo. Os marinheiros limitam-se a deixar-se transportar nas mãos dos deuses. Se estes não existissem, nunca saberíamos como é que os nautas alcançaram a Índia, que perigos venceram e de que forma. A unidade orgânica do relato da viagem não reside nem na personalidade dos heróis, nem em qualquer intriga intrínseca à própria viagem. Há, todavia, no que respeita à luta com o mar, quadros cheios de relevo e precisão, como a Tromba Marítima, o Fogo de Santelmo e o Escorbuto, e todo o canto V, um dos melhores da obra, que se poderia chamar “Trabalhos do Mar”. Mas esses episódios, onde falta sempre a presença humana, são dados de forma descritiva, exemplificativa, numa sequência oratória, e não narrativa, no discurso ao rei de Melinde. E a história da viagem de Vasco da Gama, que constitui a parte propriamente narrativa da obra, fica reduzida a uma crónica rimada, mas sem as virtudes das boas crónicas.

quinta-feira, 20 de março de 2008

10.4. Narração (I, 19 - X, 144)

10.3. Dedicatória (I, 6 - 18)

Entre as estâncias 6 a 18 do primeiro canto, Camões oferece a sua epopeia a D. Sebastião, que o poeta considerava o garante da liberdade nacional.

10.2. Invocação (I, 4 - 5)

Nas estrofes 4 e 5 do canto I, Camões dirige-se às Tágides, as ninfas do Tejo, buscando nelas uma inspiração elevada que lhe permite cantar o "peito ilustre lusitano".

Além desta, outras invocações surgem ao longo da epopeia:
  • no canto II, est. 1 e 2, invoca Calíope, musa da eloquência da poesia épica, solicitando-lhe inspiração para compor o discurso de Vasco da Gama ao rei de Melinde;
  • no canto VII, est. 78-87, dirige-se às ninfas do Tejo e do Mondego, procurando o seu favor na tarefa de cantar um povo ingrato;
  • no canto X, nas estâncias 8 e 9, invoca novamente Calíope, a quem pede ajuda para a missão de glorificar a sua pátria;
  • ainda no canto X, mas na estrofe 145, surge a terceira invocação a Calíope, a quem Camões confessa não poder cantar mais, pois o não merece "a gente surda e endurecida".

10.1. Proposição (I, 1 - 3)

A Proposição de Os Lusíadas situa-se no início do primeiro canto, abrangendo as três primeiras estrofes. Nela, Camões apresenta o assunto da sua obra, ou seja, propõe-se cantar as navegações e as conquistas portugueses no Oriente, durante os reinados de D. Manuel a D. João III, bem como os triunfos em África de D. João I a D. Manuel e a organização do reino durante a primeira dinastia.

Na verdade, Camões vai cantar os feitos guerreiros e os heróis que estiveram na génese da pátria e do império português ("as armas e os barões assinalados"), as "memórias gloriosas dos reis que..." e "aqueles que por obras valerosas", isto é, os heróis do passado, do presente e do futuro, "se vão da lei da morte libertando". Em suma, canta "o peito ilustre lusitano", um herói colectivo - facto em que a sua obra diverge das epopeias gregas e latina, que cantavam um herói individual -, representado por um herói individual: Vasco da Gama.

10. Estrutura Interna

Os Lusíadas obedecem à estrutura clássica de uma epopeia, apresentando uma Proposição, uma Invocação, uma Dedicatória e a Narração, a qual compreende quatro planos:
  • o da Viagem;
  • o da História de Portugal;
  • o da Mitologia;
  • o das Considerações Pessoais do Poeta.

9. Génse de OS LUSÍADAS

A obra de Camões foi publicada em 1572, num momento em que o chamado império português aparentava já sinais de decadência e de ruína. No entanto, Os Lusíadas exaltam a glória do povo lusitano, focando o seu período de maior fulgor: a época dos Descobrimentos, representada pela viagem de Vasco da Gama, empreendida em 1498, concretizando a descoberta do caminho marítimo para a Índia.

A premência da publicação de uma epopeia portuguesa que glorificasse a nossa «gesta heróica» era evidente e diversos autores renascentistas tinham-na destacado, nomeadamente Garcia de Resende, no prólogo do seu Cancioneiro Geral, e António Ferreira. Porém, apenas Luís Vaz de Camões matará essa sede ao, de forma genial, adoptar com originalidade a estrutura clássica da epopeia à narração da viagem de Vasco da Gama e da História de Portugal.

terça-feira, 18 de março de 2008

8. Fontes

1. Fontes Literárias

1.1. Epopeias primitivas: Ilíada e Odisseia, de Homero (?).

1.2. Epopeia de imitação: Eneida de Virgílio.

1.3. Epopeias do Renascimento:

  • Orlando Enamorado de Boiardo;
  • Orlando Furioso de Boiardo;
  • Jerusalém Libertada de Torquato Tasso.
2. Fontes históricas:
  • História do Descobrimento e Conquista da Índia, de Fernão Lopes de Castanheda;
  • Crónicas de Rui de Pina;
  • Crónica de D. Pedro, Crónica de D. Fernando e Crónica de D. João I, de Fernão Lopes;
  • Crónica de D. Afonso Henriques de Duarte Galvão;
  • Ásia de João de Barros;
  • O Tritão de Damião de Góis.

segunda-feira, 17 de março de 2008

7. Título

O vocábulo «lusíadas» foi criado por André de Resende e deriva do termo «Luso», personagem apresentada como filho ou simples companheiro de Baco.
Luso foi considerado o povoador e primeiro rei-pastor da última Tule, à qual teria dado o nome de Lusitânia e o de Lusos ou Lusitanos aos respectivos habitantes.
André de Resende, seguindo o exemplo de Virgílio, que criou o nome da sua epopeia - Eneida (< AEneades) - a partir de AEneas (Eneias), criou então o vocábulo «lusíadas». Camões, reconhecendo nele grande carga épica, adoptou-o como título da sua epopeia.

6. Características da epopeia

A epopeia clássica apresenta um conjunto de características próprias, concretamente as seguintes:
1. Acção: conjunto de acontecimentos relativos ao desenvolvimento do tema.
1.1. Qualidades da acção:

. Unidade:
as diferentes partes devem ligar-se de maneira a que formem um todo harmonioso.

. Integridade:
as relações que ligam os acontecimentos devem criar uma intriga com princípio, meio e fim.

. Variedade:
consiste na introdução de pequenas narrativas - os chamados episódios - que embelezam a acção e quebram a sua monotonia.

. Verdade:
o assunto da epopeia deve ser real, ou pelo menos verosímil.

2. Personagens.

3. Maravilhoso: a intervenção de entidades divinas / sobrenaturais:
. Pagão: a intervenção de deuses pagãos (os deuses gregos e romanos).
. Cristão: a presença do Deus do cristianismo.
. Mágico: as feitiçarias e crenças populares.
. Alegórico: os vícios ou as virtudes personificados (à semelhança da componente alegórica do Auto da Barca do Inferno).
4. Forma: texto narrativo em versos decassilábicos, soltos ou rimados, dispostos, geralmente, em oitavas.

5. A Epopeia

A epopeia é uma narrativa, geralmente em verso, que enaltece os feitos extraordinários de um herói ou de um povo, feitos esses que pressupõem um interesse universal. Ao longo de mais de vinte séculos, muitas foram as epopeias que viram a luz do dia.
  • Ilíada - séc. VIII a.C. - da autoria de Homero (?) - narra, em 24 cantos, tantos quantos as letras do alfabeto grego, as aventuras de Aquiles, o mais famoso dos heróis gregos, durante o último ano da guerra de Tróia.

  • Odisseia - séc. VIII a.C. - da autoria de Homero (?) - narra, em 24 cantos, as aventuras de Ulisses no regresso da guerra de Tróia até chegar a Ítaca, sua Pátria, onde o esperava Penélope, a esposa, modelo de fidelidade.

  • Eneida - séc. I a.C. - da autoria de Virgílio, poeta latino (70-19 a.C.) - em 12 cantos, narra as aventuras de Eneias e dos seus companheiros, desde a queda de Tróia até à fundação de Roma. Nesta epopeia, Virgílio imita a Odisseia nos seis primeiros cantos e a Ilíada nos seis últimos.

  • Cantar de Mio-Cid - séc. XI d.C. - autor desconhecido - retrata a luta contra os mouros.

  • Chanson de Roland - séc. XI d.C. - autor desconhecido - narra a derrota infligida pelos Bascos à retaguarda do exército de Carlos Magno, em 777, em Roncesvales, passagem dos Pirenéus.

  • Orlando Enamorado - séc. XV - da autoria de Boiardo (1441 - 1494) - obra estruturada em 69 cantos, que narra as aventuras cavaleirescas e amorosas, no contexto das lutas entre cristãos e mouros.

  • Orlando Furioso - séc. XVI - da autoria de Ariosto (1474 - 1533) - narra, em 46 cantos, as aventuras cavaleirescas e amorosas, no contexto das lutas entre cristãos e mouros.

  • Os Lusíadas - séc. XVI - da autoria de Camões (1524/25(?) - 1580) - em dez cantos, Camões procede à narração dos feitos gloriosos do povo português, culminando com a descoberta do caminho marítimo para a Índia.

  • Jerusalém Libertada - séc. XVI - da autoria de Torquato Tasso (1544 - 1595) - em vinte cantos, narra a conquista da Palestina por parte do exército da 1.ª Cruzada, tendo como herói Godofredo de Bulhões.

4. Cronologia de Camões

  • 1524 ou 1525 - Datas prováveis do nascimento de Luís Vaz de Camões, talvez em Lisboa.
  • 1548 - Desterro no Ribatejo; alista-se para o ultramar.
  • 1549 - Embarca para Ceuta, onde perde o olho direito numa escaramuça com os mouros.
  • 1551 - Regressa a Lisboa.
  • 1552 - Numa briga, fere um funcionário da cavalariça real e é preso.
  • 1553 - É libertado da prisão e embarca para o Oriente.
  • 1554 - Parte de Goa em perseguição de navios mercantes mouros, sob o comando de Fernão de Meneses.
  • 1556 - É nomeado provedor-mor em Macau; naufraga nas costas do Camboja.
  • 1562 - É preso por dívidas não pagas, sendo posteriormente libertado pelo vice-rei, conde de Redondo, e distinguido seu protegido.
  • 1567 - Segue para Moçambique.
  • 1570 - Regressa a Lisboa na nau Santa Clara.
  • 1572 - Sai a primeira edição d'Os Lusíadas.
  • 1579 ou 1580 - Morre de peste, em Lisboa, a 10 de Junho.

3. A descoberta do caminho marítimo para a Índia

A partir dos inícios do século XIV, Portugal centra a sua atenção no mar e reforça a sua condição marítima.
Um dos grandes feitos praticados pelos nautas portugueses foi a chegada à Índia por mar, uma empresa impulsionada por D. Manuel I que, em 1497, enviou uma armada de quatro navios, com cerca de cento e cinquenta homens, liderada por Vasco da Gama. O objectivo régio estava relacionado com as informações, enviadas por Pêro da Covilhã, que chegou a Calecute em 1488, ao seu antecessor, D. João II, segundo as quais aquela cidade indiana constituía um entreposto fundamental em todo o comércio do Oriente, disseminado por uma complexa rede que penetrava no golfo Pérsico e no mar Vermelho, outra que se dirigia para o golfo de Cambaia e mais duas para Bengala e para Malaca. D. Manuel I procurava, precisamente, «tomar conta» destas redes comerciais, daí ter enviado Vasco da Gama para negociar com o rei de Calecute um acordo de comércio, instalando aí uma feitoria portuguesa, se tal lhe fosse permitido, para dar início ao comércio de especiarias.

A frota de Vasco da Gama era constituída por quatro embarcações: as naus São Gabriel (capitaneada por Vasco da Gama) e São Rafael (comandada por Paula da Gama), uma caravela, ou uma nau (as opiniões a este respeito divergem), capitaneada por Nicolau Coelho, conhecida por Bérrio (nome cuja origem radica no apelido do seu piloto), e uma nau que servia como navio de apoio (comandada por Gonçalo Nunes).

A armada saiu da barra do Tejo, no Restelo, a 8 de Julho de 1497. Seguidamente, passou pelas Canárias, deteve-se em Cabo Verde, deu uma larga volta pelo Atlântico Sul e passou o Cabo da Boa Esperança em 22 de Novembro de 1497.

Entre o Natal desse ano e 24 de Abril de 1498, a armada explorou a costa oriental de África, e a 18 de Maio atingiu a Índia a norte de Cananor, tendo regressado a Lisboa em 10 de Julho de 1499.

A viagem encetada e concluída por Vasco da Gama abriu a Carreira da Índia, ou Rota do Cabo, isto é, a ligação marítima regular entre o Ocidente e o Oriente, o que possibilitou estabelecer trocas comerciais, alargar e consolidar o império português, difundir a língua e a cultura portuguesas e transmitir os valores e ideais da religião cristã. Por outro lado, permitiu aos europeus um conhecimento verdadeiro sobre o continente africano, o Oriente e a América do Sul, as suas gentes e costumes, a fauna e a flora.

2. Renascimento português - limites cronológicos

Não é possível estabelecer datas cronológicas precisas para o Renascimento em Portugal, ainda assim é consensual situá-lo entre meados do século XV e finais do século XVI, uma época de grande desenvolvimento do país e de afirmação no mundo.

1. A Época do Renascimento


A época do Renascimento modificou radicalmente o pensamento da Idade Média, na sua procura de construir uma época de modernidade, marcada pelas descobertas e progresso a todos os níveis.


A nível de contexto, são várias as rupturas que se estabelecem com o período anterior:



  1. No século XVI, o sistema feudal findou, o que porporcionou uma maior liberdade social e económica ao povo.


  2. Assim, a economia desenvolveu-se porque as pessoas começaram a produzir para si próprias, sem terem de pagar tributos aos senhores (feudais), podendo, depois, vender ou trocar os seus produtos.


  3. A curiosidade popular pelo desconhecido foi um dos factores que conduziu aos Descobrimentos portugueses (dos quais se destacam a descoberta do caminho marítimo para a Índia e a chegada ao Brasil).


  4. A aprendizagem teórica característica da Idade Média (Escolástica) foi substituída pelo desejo de obter um conhecimento «de experiência feito».


  5. Entretanto, em meados do século XV, Guttenberg criou a imprensa, o que tornou muito mais fácil a cópia, o acesso e a circulação do livro, uma vez que eram produzidos de forma mais célere e em maior quantidade.


  6. Em simultâneo com as descobertas, ocorreu um avanço da técnica de construção naval e dos instrumentos náuticos/de navegação.


  7. Entrementes, começou-se a questionar o poder exagerado da Igreja Católica, com sede em Roma.


  8. Erasmo de Roterdão e, posteriormente, Martinho Lutero defenderam a tradução da Bíblia para as línguas de cada país e a sua livre consulta e interpretação, o que, conjuntamente com outras ideias, levou à designada Reforma Protestante.


  9. Ao nível cultural, os autores desta época começaram a interessar-se pela Antiguidade Clássica grego-romana, visto que, não obstante tratar-se de civilizações muito antigas, continhm ainda uma modernidade e uma abertura de ideias que podiam servir de modelo.


  10. O Homem passou a ser o «centro do mundo» (antropocentrismo). Este interesse e valorização de tudo o que é humano tomou o nome de Humanismo.

    Homem de Vitrúvio



  11. O antropocentrismo substituiu o teocentrismo medieval, ideologia que punha Deus no centro do mundo e das preocupações humanas. Isto não significou que o Homem deixasse de acreditar na divindade, pelo contrário, e contava mesmo com a sua protecção, mas passou a acreditar, igualmente, que , através das suas acções, podia planificar o seu próprio destino, libertando-se da opressão e do medo da «castigadora mão divina».


  12. Mandaram-se construir palácios, praças, fontes, parques, todos os edifícios que se considerassem belos, confortáveis e úteis para o ser humano, por oposição às escuras catedrais e às fortalezas da Idade Média, destinadas a servir os interesses da Igreja e dos senhores feudais medievais.


  13. No que diz respeito à pintura e à escultura, redescobriu-se a beleza e a perfeição do corpo humano, o que está patente nos nus de Miguel Ângelo.

  14. Relativamente à música, o canto gregoriano (destinado aos mosteiros e às celebrações religiosas) foi substituído pelas chamadas músicas profanas de palácio, destinadas a animar o serões de festas.

  15. Ao nível da literatura, revaloriza-se a epopeia, destinada a glorificar grandes feitos e/ou os respectivos heróis, e a poesia amorosa.